Escritos Lendários: O Vampiro Antes de Drácula

A origem literária do vampiro ocidental

Ao escrever Drácula, Bram Stoker utilizou-se de todo um arcabouço teórico e literário que foi consolidado durante todo o século XIX.

E mostrar quais escritos literários ajudaram a compor a imagem do vampiro de origem nobre, com mulheres fatais e superstições dos camponeses é o que O Vampiro antes de Drácula propõe.

Martha Argel e Humberto Moura Neto fizeram uma seleção de 12 contos publicados durante o séc. XIX que antecederam o romance de Stoker, num recorte que procura apresentar as várias facetas que o mito foi adquirindo com o tempo na literatura.

Algumas histórias são conhecidas e constantemente publicadas no Brasil, mas a também há contos desconhecidos do grande público, que tiveram poucas publicações no país ou nunca haviam sido traduzidas.

Além da apresentação em ordem cronológica de publicação, também houve o cuidado de incluir contos de autores de várias nacionalidades, como o inglês Lord Byron, o russo Alexei Tolstoi e o francês Alexandre Dumas. E o último conto apresentado, do próprio Bram Stoker, seria um capítulo que foi cortado, pelo autor, da versão final de Drácula.

Fazem parte da coletânea:

O vampiro (1819), de John Polidori
Fragmento de um relato (1816) de Lord Byron
O retrato Oval (1842) de Edgard Alan Poe
A família do Vurdalak (1847), de Alexei Tolstoi
A dama pálida (1849) de Alexandre Dumas, pai
O Horla (1886), de Guy de Maupassant
Um mistério da Campagna (1887), de Anne Crawford
O velho Éson (1891) de Arthur Quiller-Couch
O último dos vampiros (1893), de Phil Robinson
A verdadeira história de um vampiro (1894), do conde de Stembock
A floração da estranha orquídea (1895) de H.G. Wells
O convidado de Drácula (entre 1890 e 1897), de Bram Stoker

A construção do mito contemporâneo

Além deles a obra conta com uma introdução e posfácio que são, na minha opinião, as melhores partes do livro.

Na introdução há uma concisa apresentação da origem literária do mito do vampiro ocidental, os contos e poemas que são considerados a origem do tema, suas diversas faces no decorrer do séc. XIX e as diferentes configurações que assume em vários países.

Os autores tem todo um cuidado ao explicar e descrever ao leitor como o vampiro fruto da imaginação de camponeses vai, aos poucos, se transformando no nobre perigoso e sedutor do final do séc. XIX, e  como o teatro o popularizou o tema vampírico, causando escândalos e levando o tema até regiões e parcelas da população que não o conheceriam de outra forma.

Há também a descrição da existência de toda uma literatura barata, conhecida como penny bloods, vendida na forma de folhetins, que mescla conceitos do vampiro teatral, inspirado na obra de John Polidori, com conceitos e superstições da camada mais pobre da população. E, num efeito de retro-alimentação, estes folhetins acabam influenciando o teatro e livros escritos a partir de então. O tema é popularizado e toda uma gama de variedades de vampiros toma corpo pela Europa, agradando gostos que vão do gótico romântico ao terror folhetinesco.

No posfácio, intitulado Drácula: a cristalização do mito, os autores fazem uma breve análise da obra de Bram Stoker, os livros que claramente o influenciaram e de alguns mitos sobre a obra que surgiram posteriormente. E de como os personagens Drácula, Van Helsing, Mina e Jonathan Harker tornaram-se as maiores referências sobre o mito do vampiro ocidental e qualquer obra que veio após, escrita ou áudio-visual, é imediatamente comparado e analisado sob a luz da obra de Stoker.

Tanto a apresentação como o posfácio são muito bem documentados, com todas as citações devidamente nomeadas e que podem servir como grande fonte de referências para estudos mais aprofundados, o que, por si só, já valeria ter este livro na estante.

Não bastasse isso, a escrita também é bem agradável e trata o leitor de forma inteligente, informando e instigando a busca por maiores conhecimentos sobre vampiros.

Acredito ser uma leitura, no mínimo, valiosa para quem gosta do tema, jogadores de RPG e estudiosos deste ser que povoa o imaginário ocidental, a literatura, teatro, cinema e jogos a mais de 2 séculos.

Argel, Marta e Moura Neto, Humberto (organização, comentários e tradução) – O VAMPIRO ANTES DE DRÁCULA – São Paulo, Ed. Aleph, 2008

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