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Nesse episódio do Papo Lendário, Leonardo Mitocôndria e Ju Ponzi conversam com Marcos Keller sobre o deus nórdico Odin.
Conheça os diversos nomes desse deus, e seu significado.
Veja os inúmeros os inúmeros símbolos que acompanham as imagens desse deus.
Ouça sobre as diversas formas de Odin.
– Esse episódio possui transcrição, veja mais abaixo.
— LINKS —
— EQUIPE —
Pauta, edição: Leonardo Mitôcondria
Locução da abertura: Ira Croft
Host: Leonardo Mitôcondria
Participante: Ju Ponzi
Convidado: Marcos Keller
— APOIE o Mitografias —
— Agradecimentos aos Apoiadores —
Adriano Gomes Carreira
Alan Franco
Alexandre Iombriller Chagas
Aline Aparecida Matias
Ana Lúcia Merege Correia
Antunes Thiago
Bruno Gouvea Santos
Clecius Alexandre Duran
Déborah Santos
Domenica Mendes
Eder Cardoso Santana
Edmilson Zeferino da Silva
Everson
Gabriele Tschá
Jonathan Souza de Oliveira
José Eduardo de Oliveira Silva
Leila Pereira Minetto
Leonardo Rocha da Silva
Leticia Passos Affini
Lindonil Rodrigues dos Reis
Mateus Seenem Tavares
Mayra
Nilda Alcarinquë
Rafa Mello
Talita Kelly Martinez
— Transcrição realizada por Amanda Barreiro (@manda_barreiro) —
[00:00:00]
[Vinheta de abertura]: Você está ouvindo Papo Lendário, o podcast de mitologias do projeto Mitografias. Quer conhecer sobre mitos, lendas, folclore e muito mais? Acesse: mitografias.com.br.
[Trilha sonora]
Leonardo: Muito bem, ouvintes. No episódio de hoje, falaremos sobre o pai de todos. Quem conhece mesmo mitologia sabe que eu não estou falando do deus hebraico, e sim de outro deus barbudo. Hoje falaremos de Odin. E, para isso, eu estou aqui com a Ju Ponzi. Então pode aí falar com os ouvintes.
Ju Ponzi: Olá, queridos e queridas. Vocês estão bem? Vamos falar do seu Odin? Do mosca-olho? Tão querido por uns, tão odiado por outros.
Leonardo: E também estamos com um convidado aí, o Marcos Keller.
Marcos Keller: Esse jovem, e velho, e médio, e que deu rolê por todo lugar, e que batalhou, e que, dependendo de quem conta a história, tem mais característica do que muita gente viva.
Leonardo: E esse aí que todos nós adoramos. E aliás, vocês dois, antes que eu me esqueça, que eu deixe para o final e acabe esquecendo, façam já as divulgações de vocês, como os ouvintes podem encontrá-los.
Ju Ponzi: Então, meus amores, eu e Keller estamos juntos, unidos em um só coração no Magickando, que é o, digamos assim, puxadinho do Mundo Freak. Será que o Andrei vai ficar bravo se eu falar isso? Mas é o puxadinho do Mundo Freak. Lá estamos falando a cada quinzena sobre magia, capirotagens, falamos inclusive… não é, Keller? Falamos pouco sobre aspectos mitológicos de deuses lá. Acho que é uma coisa que temos que abordar. Mas, se você se interessa por esses assuntos, se você gostaria de saber, a gente fala muito sobre livros, a gente analisa. Inclusive, também fizemos um episódio, se você não ouviu ainda, maravilhoso sobre as previsões de 2020. Você encontra a gente lá no Magickando.
Marcos Keller: E outro lugar onde você vai encontrar tanto eu quanto a Ju Ponzi e mais uma galera, às vezes até o Leo, é lá no Mundo Freak Confidencial. É o podcast guarda-chuva, carro-chefe da casa de onde o Magickando também pertence, e nós falamos sobre várias coisas insólitas. Lá nós temos papo de UFO, falamos de mitologia, falamos sobre religiões, falamos sobre relatos, falamos de tudo, e agora tem rolado até uns áudio dramas, umas historinhas de ficção. Está mó legal, cola lá.
Leonardo: Muito bem, deixar todos os links aí, a indicação dos podcasts. E, como, muitos meses passados aí, todo mundo nas internets ficava falando para darem um trocado para o Bruxo, fica aqui a recomendação para vocês darem um trocado aí para a nossa bruxa favorita aí. Contratem a Ju para fazer os jogos de runas aí, as leituras de runas.
Marcos Keller: Sim.
Ju Ponzi: Exatamente. Os monstros… porque todo mundo fala assim: “Ah, mas eu não vou te dar um trocado, porque você não mata monstros”, mas eu mato sim, eu mato o monstro da sua dúvida, eu mato o monstro que se chama autossabotagem dentro de você. Vem fazer leituras de runas comigo que eu mato vários monstros, sim.
Marcos Keller: Esse aí dá trabalho, hein?
Ju Ponzi: Esse dá.
Leonardo: Bom, então vamos falar de um dos nossos deuses favoritos aqui. Acho que nós três estamos aqui por nada, a questão é que a gente realmente adora muito o Odin, um dos meus deuses favoritos. Então vamos começar aí a falar dele. Bom, acho que muito ouvinte aí já conhece por a gente citar várias vezes aí, porque o Odin é foda mesmo, ele é o deus supremo dos povos nórdicos. Lá da casa dele, ele consegue ver todos os nove reinos, ele manda em tudo.
Ju Ponzi: Ele mora na cobertura.
Leonardo: E o Odin é famosão por esse nome, ser chamado de Odin, mas, como todo bom deus, ele tem vários epítetos, tem variações no nome dele. Um outro bem comum que vocês encontram é o Wotan, mas mesmo assim, entre Wotan e Odin, tem várias versões, tais como Othinno, Wodanaz, Wodan, Woden, (Wovin) [00:05:01], Wodan, Wotan, Wodan, Wut e Wuds. Isso tudo imaginem em um sotaque mais germânico.
Ju Ponzi: E, olha, já vou invocar a linguista, já vou tirar a cartinha da linguista, jogar aqui na mesa: todos esses nomes que o Leo citou para vocês, ele falou nome no saxão antigo, no anglo-saxão, no gótico, no francônico, ele falou um monte de nomes aí para vocês de várias línguas. O que todos eles têm em comum? Todos eles têm a raiz do que nessas línguas seria a palavra cólera, raiva extrema. Por exemplo, wut, até hoje, em alemão, é quando você está pê da vida, quando você está colérico. Então ele fala muito desse lance, porque é um deus que está lá na febre do rato, então todas essas línguas têm a mesma raiz, que seria essa ideia de: é uma pessoa que não é sentada, como a gente vê muitas vezes retratado nas gravuras, apenas sentada em seu trono. Não, é aquela pessoa que está sempre [grito], então talvez seja por isso que se ligue a imagem dos vikings sempre como pessoas raivosas, fazendo coisas, derrubando coisas – vem desse nome.
Marcos Keller: Você está falando de um cara que a vida dele foi sempre treta. Você não acha uma historinha, tipo, de boa assim: “Levantei, fui comprar pão e voltei”. Sei lá, “Vi a vaquinha, ordenhei e voltei para casa”, não, é sempre baseado em muito sacrifício, muita treta e o paraíso é continuar tretando.
Ju Ponzi: O paraíso é a treta infinita, onde todo mundo morre e renasce só para tretar.
Marcos Keller: Tretar e comemorar. E a gente sempre brinca, quando a gente fala alguma coisa assim no Magickando, a gente sempre dá umas brincadeiras e fala: “Nossa, essa situação de treta e tal”, mas é porque a vida do nórdico médio era baseada em quê? Era baseada em uma treta contínua com a natureza, contra outros povos e pela sobrevivência, então nada mais justo que a divindade que reflita o total desse povo seja uma divindade treteira e sempre, como a Ju falou, gritando.
Leonardo: Porque a gente vai pensar dessa forma: ah, furioso, violento e tudo, imagina algo meio ogro, meio bárbaro, mas o Odin, eu acho que ele não se liga tanto a esse… tipo o Thor. O Thor é mais assim, de só descer a porrada e acabou. Não, o Odin, por ele também ser o deus da sabedoria, ele é muito essa coisa de tentar resolver o problema, inúmeros problemas. Vai ter aquela violência, mas não é só descendo a porrada. Pode até ter que usar a violência, mas ele tem que usar de forma estratégica, porque ele é o deus da sabedoria.
Ju Ponzi: Eu vou fazer um paralelo muito pobre, porém será, talvez, claro para o ouvinte, para o ouvinte entender: o Thor é aquele cara que sai da casa atrás de uma briga de graça, sabe? Aquela pessoa que toma uma dose antes de sair de casa e fala assim: “Hoje eu quero sair para brigar, eu vou sair para tretar”. Eu tenho certeza que você já encontrou vários desses, principalmente no bar à noite, na balada. Você já encontrou uma pessoa assim em algum momento. Odin, a sua briga, a sua treta, é muito bem, número um, escolhida e, número dois, muito bem pensada. Inclusive, que eu não vou queimar pauta aqui, mas em muitas idades, digamos assim, do mundo, meio que Tyr e Odin viraram uma coisa só. Odin comeu esse aspecto, ele engloba Tyr, porque Tyr é o cara que é o general, é o estratégico, é aquele cara que vai, ele tem uma treta, mas ele tem todo um jeito de pensar e de resolver as coisas de um jeito muito engenhoso. O Thor é o cara briguento, ele quer tretar. A ideia é essa.
Leonardo: Aí você vê como que os deuses, e aí isso muito principalmente o Odin foi mudando com o tempo, foi evoluindo até chegar a esse patamar do deus supremo onde ele é o pai de todos, o pai dos mortos, o pai dos deuses, o pai das batalhas, o pai dos exércitos, o pai das escolhas. Esses são todos os epítetos dele. Ele é o pai. E, com isso, com essa evolução, com todo esse detalhamento e essa complexidade do que o Odin tem, ele tem inúmeros domínios, e, bom, ele sendo algo assim violento, ele é um deus da guerra, como muitos deuses nórdicos, tem vários deuses da guerra, o Odin é um deles, mas, como tinha dito, ele também é o deus da sabedoria, e aí também engloba deus da caça, da vitória, da morte. Essa questão de ser deus da morte é importante.
Marcos Keller: Tem uma coisa que eu gosto muito na figura do Odin, é uma coisa que eu estou sempre falando, sempre batendo. Eu e a Ju tivemos umas conversas muito legais sobre isso, que o que torna Odin uma coisa tão complexa, até difícil de ser retratada em qualquer tipo de mídia atual é o fato de que ele é um deus extremamente multifacetado. A gente está muito acostumado, hoje em dia, a achar que deuses são aplicativos, então, tipo, eu vou lá e falo: “Ah, não, esse aqui é o deus do amor – é o Tinder; esse aqui é o deus da comunicação – é o Whatsapp; esse aqui é tal coisa”, como se eles só fizessem aquilo, e Odin é uma loucura, porque ele está há tanto tempo sendo cultuado, ele está há tanto tempo sendo posicionado e ele tem tantas histórias que contam a respeito dele próprio ou mesmo fatos de canibalização de conceito, como a Ju mesmo falou de misturar em alguns momentos com o Tyr, que ele acaba sendo uma criatura extremamente multifacetada, o tornando muito complicado de você retratar na mídia sem que fique estranho para alguns. Então, se você vir um Odin, por exemplo, em algum filme, você espera que ele… ele pode aparecer como velho. Você vê Sandman: em Sandman, aparece o Odin velho, de chapéu, dando um rolê pela Terra com o seu cajado – às vezes a lança, às vezes o cajado. Aí, de repente, você vai para o Deuses Americanos, você vê um outro Odin, que é um Odin que o comportamento dele é o comportamento do Odin da doideira, o Odin que movimenta o mundo, o Odin que anda. E aí, depois, você vai para um outro local, você vê o Odin guerreiro, o cara que desce a porrada. Aí você tem o Odin autossacrificado. Então é uma loucura, cara, é um cara muito complexo para você entender. É isso que o torna tão próximo do humano, porque a gente também é assim. Ou seja, ele não é um aplicativo, é um smartphone completo.
Ju Ponzi: Gostei. Acrescentando um tiquinho em tudo que o Leo falou, a gente não pode esquecer: tem um historiador que, se não me engano, ele chama Page, Raymond Page, e ele fala que existem também alguns povos que ligaram a figura do Odin com o lado do comércio. Então ele também tem isso, porque ele é o cara que controla os ventos.
Marcos Keller: Olha que legal.
Ju Ponzi: Tipo, então ele é ligado ao comércio, porque “Ah, eu vou fazer essa galera chegar até aqui ou chegar aonde tem que chegar para estabelecer esse comércio”. E, ao mesmo tempo, porque, digamos assim, seria a oitava alta, falando muita besteira, mas a oitava baixa seria assim: como ele controla os ventos, ele também é muito instável, então ele pode estar soprando um vento joia para vocês; você fez um negócio fora da curva ali, virou o seu barquinho. A ideia é essa.
Marcos Keller: Aí vira o ovo e vira o seu barco, não é?
Ju Ponzi: É.
Leonardo: É interessante essa questão de estar relacionado ao comércio também, porque aí, pesquisando o Odin, eu estava vendo que, quando os romanos tiveram contato ali com os germânicos e tudo, eles viram o Odin e relacionaram: “Ah, é que nem o Mercúrio”, e aí você fica meio assim: “Meu, espera aí, o que Odin… o que diabos Odin teria a ver com o Mercúrio?”, mas aí, quando você vai além dessas representações estereotipadas de cada divindade e vê o que elas vão representar, quais as diversas representações que ela tem para as suas devidas culturas, você consegue ver essa relação. Eles estavam comparando o Odin com o Mercúrio nessa questão de ele ser aquela divindade relacionada ao comércio ali, e, com isso, uma cerca comunicação também, então faz essa comparação.
Marcos Keller: Odin é um psicopompo, ele caminha pelos nove mundos, então você tem algumas proximidades conceituais ali, mas as diferenças são muito mais profundas, então é muito louco isso.
Leonardo: E essa ideia de o Odin ser um psicopompo… antigamente, alguns tempos atrás, quando eu não via o quão Odin era tão complexo assim, eu não imaginava tanto. No máximo, um psicopompo mais para as Valquírias, que estavam ali na batalha mesmo, mas, quando você vê que ele realmente também poderia fazer esse serviço delas e ele estaria muito ligado à morte, nossa, para mim foi muito legal vendo isso aí, porque aí trouxe um outro aspecto dele, que é uma das coisas que me chama muito a atenção nele, que ele também tem um quê meio trickster ali. Então ele vai ter esse aspecto do psicopompo; e muitos tricksters, a gente vê que têm essa relação de cruzar a linha entre a vida e a morte, como um bom psicopompo.
Marcos Keller: É, o psicopompo tem que ser ligeiro, então é muito comum que ele seja associado aos tricksters também.
Leonardo: Poucas vezes eu vi uma análise assim do Odin. Mesmo que o colocasse como um trickster, não se aprofundava tanto, mas isso é uma coisa que me chama muito a atenção, que me faz gostar muito dele, é esse aspecto trickster, porque, quando você pensa: trickster dos nórdicos – todo mundo pensa no Loki. E, tipo, legal, o Loki é um personagem também complexo, tem variações nele, tem muita coisa a se analisar, mas eu – olha, isso mais uma opinião minha – vejo o Loki bem como aquele trickster extremamente caótico mesmo, aquela coisa de, se você está do lado dele, você não sabe o que vai esperar dele. O do Odin eu vejo que é uma coisa mais… ele faz as coisas do jeito que ele quer, mas ele tem uma estratégia. Nada que o Odin faz é realmente caótico. Pode muitas vezes parecer caótico para você, mas meio que, tipo, ele está ali planejando, e eu acho que o Odin é daquele jeito assim: o que ele quer, ele vai atrás e ele faz, foda-se o que ele tiver que fazer. Ele pode ter que se sacrificar na árvore ali, ficar com a lança enterrada nele, mas ele vai atrás e faz pelo que ele quer. Então ele vai dar um jeito, vai desdobrar o mundo todo para conseguir o que ele quer. E, nesse aspecto, traz um quê meio de trickster, de que ele precisa ser malandro no nível ali para conseguir as coisas também.
Marcos Keller: Isso é um processo comum. Sabe essa confusão de falar: “Meu, mas será que tem essa característica?”, e eu sempre brinco também que isso é porque a gente vem com uma cabeça de bestiário de D&D: dá para colocar todo mundo nessa caixinha aqui, essa caixinha eu comparo com essa, e aqui é a mesma coisa. Porra nenhuma, meu irmão. Não tem nada disso. A vida tem esse mau hábito de as linhas serem sempre nubladas, quando não completamente borradas. Então é muito louca essa parada. Aí, quando você entende que, na mitologia, até na própria mitologia grega clássica, você tem gente que, em determinado momento, eu vou pedir por alguma coisa de sabedoria, eu peço para Afrodite, porque Afrodite também é uma deusa, ela também é sábia. A principal atribuição divulgada é a do amor, mas ela é uma divindade, ela também é longeva, inteligente, sábia, entre outras coisas. Então você percebe que não é só uma coisa pontual, e isso destroça a nossa cabeça na tentativa de organizar as coisas. Isso arrebenta, porque a gente quer sempre categorizar.
Leonardo: E isso é um dilema que eu vivo acho que todo dia, porque eu gosto de definir as coisas e deixar certinhas ali, categorizadas, mas eu já tenho anos e anos estudando mitologia, eu tenho noção que não dá para ser assim. E, ao mesmo tempo, eu fico puto quando as pessoas acham que “Ah, não, então é só deus disso, deus daquilo, pronto”, sabe? Não é simples assim.
Marcos Keller: E a simplificação é um erro conceitual do século 19. Isso é um erro conceitual que a gente teve na hora que os pesquisadores, especialmente ingleses e franceses do século 19 em geral, foram botar tudo em uma caixa, e aí essa caixa já está ocupada por alguém de sabedoria, então não posso colocar esse outro. Aí acaba dando esse tipo de problema.
Leonardo: E é nisso que, aí, quando você vai estudando mais a fundo cada cultura e seus respectivos panteões, você consegue perceber o que aquela cultura realmente dava muito valor. Então a gente vê o Odin como um deus da guerra, por quê? Porque os nórdicos precisavam disso. Querendo ou não, eles tinham que dar valor para a guerra – todo povo antigo sempre dava; até atualmente dá-se muito valor à guerra, mas os nórdicos, isso era muito próximo deles, porque era parte de eles se sustentarem. Então a gente tem inúmeros deuses da guerra, inclusive o Odin. A gente vai ter o Tyr, como a gente tinha citado antes, o Odin foi pegando alguns dos domínios, algumas características do Tyr, se tornando um deus da guerra. Antigamente, ele era até mais um deus só mais dos guerreiros mortos, então ele… e isso, também essa complexidade das divindades vai porque as divindades são reflexos humanos e nós também somos complexos, somado a todo o tempo que eles vivem ali na cultura mesmo. O Odin, se não me engano, foi se tornando realmente uma divindade suprema porque ele era deus da morte, aí foi se tornando um deus mais voltado para a guerra, e aí os líderes das tribos ali – isso coisa bem antiga, antiga mesmo -, dos povoados nórdicos ali, querendo ou não seriam guerreiros também, então, “Pô, eu preciso de um deus da guerra para me representar, mas, já que eu sou líder, esse deus precisa ser um deus líder”. Então isso que foi fazendo o Odin subir ao trono. Isso falando em um aspecto histórico-antropológico. Você não encontraria um mito do Odin voltado a isso. Na adoração dele, tem-se essa hipótese de que ele foi subindo por causa dos líderes das tribos – vamos chamar de tribos, assim, dos povos nórdicos.
[Trilha sonora]
[Bloco de recados]
[Trilha sonora]
Leonardo: Mas, ainda assim, o Odin, por mais que tenha essa complexidade, ele vai ter alguns aspectos, pelo menos em uma imagem popular, que ele se torna mais uniforme. Só que, ao mesmo tempo, é interessante analisar que cada imagem dele, cada característica ali, cada elemento na representação dele tem um porquê, tem uma mensagem. E aí a gente pode criar um Odin mais classicão, pelo menos em sua aparência, por exemplo, a ideia de ele usar um tapa-olho, o conceito dos sacrifícios, os corvos que estão junto com ele, a lança dele, o anel que ele usa, o cavalo dele e os lobos. Esses são elementos bem clássicos do Odin, onde… muita representação você pode ver sem um ou outro, mas pelo menos um desses vai ter.
Marcos Keller: Eu acho muito legal esse tipo de questões, porque elas são sempre… como é que eu traduzo isso? Espera aí. É um design de vida sofrida. Você vê que o Odin sempre tem esse design de alguém que passou uma vida difícil, então o cara está com o lobo – para o cara estar com o lobo, ele tem que ter lidado com um lobo, ele tem que ter domado um lobo, então não é festa. O corvo – o corvo é um bicho que faz o que quer, o corvo é um pássaro que faz o que quer, então, para o cara ter dois corvos domados, é porque ele teve que trabalhar com os corvos ali, tem que ser mais sangue frio que o corvo. Para você ver, está carregando uma lança, tem que ser alguém de caça. Para o cara estar sem um olho, ele tem que ter perdido. E é muito louco, porque é muito comum você ver, principalmente na imagem mais greco-romana, ocidentalizada e tal, existe uma certa perfeição, existe o ideal greco-romano que se espera da divindade. Então, a primeira vez que eu vi o Odin meio fudido assim, eu falei: “Rapaz, (inint) [00:21:17] esse maluco”.
Ju Ponzi: E aí, puxando aí o lance do corvo e tudo mais, talvez eu possa estar abrindo demais o leque, mas eu acho que as pessoas conhecem muito sobre o corvo falante, entre aspas, por causa do Edgar Allan Poe, que tinha o corvinho lá no poema, que ficava repetindo o Nevermore, Nevermore. Existe uma linha da mitologia – não são todas – que diz que o corvo aprendeu a falar, porque, gente, vocês acham que papagaio nos imita? Vocês não viram corvo. Uma das linhas das histórias fala que o corvo só aprendeu a falar por causa do Odin. Os fofoqueiros pessoais de Odin, porque são os caras que trazem todas as notícias e tudo mais. Então existe uma linha que diz que os corvos aprenderam a falar porque Odin ensinou. Então o cara não só domou, mas ele ensinou o filho da mãe a falar, a repetir as coisas que eles ouviam para poder…
Marcos Keller: Trazer as notícias.
Ju Ponzi: Exatamente, para trazer as notícias, o que estava sendo falado lá.
Marcos Keller: É por isso que o passarinho do Twitter está errado.
Leonardo: É isso que eu estava pensando agora, nossa, o Twitter é um pássaro e ele fica trazendo notícia? Tinha que ser um corvo ali.
Ju Ponzi: Tinha que ser um corvinho. E não só na mitologia nórdica, mas o corvo está em um monte de mitologias e tudo mais. Eles eram o grande portal do Uol do Odin, entendeu? Porque eles traziam, eles ficavam o dia inteiro para lá e para cá e, de noite, o Odin sentava-se tranquilamente e recebia todas as notícias através dos dois.
Leonardo: Só a título de curiosidade, os nomes desses corvos significam o pensamento e a memória, então tem todo um quê: quem era realmente que estava ali levando a informação para o Odin? O próprio conceito de pensamento e memória. Então tem toda uma imagem nisso tudo. Mas corvo é uma coisa bem interessante, principalmente nessa região. É que também eu não sei se tem corvo originalmente em outros locais do mundo, não sei até onde os corvos foram, mas nessa parte da Europa ali, e aí você vai para os celtas também, o corvo tem uma importância.
Marcos Keller: Você que está ouvindo a gente: pare aí e procure na internet qualquer vídeo de corvo fazendo coisa. Tem corvo falando, tem corvo imitando barulho de coisa, tem corvo usando ferramenta para abrir gaiola. É muito louco você ver como é um bicho ligeiro e inteligente.
Ju Ponzi: Eu não sei se era exatamente essa história, mas pouco tempo atrás saiu uma notícia de que havia uma menininha que colocava comidinha na janela dela e tinha um corvo que sempre ia comer, e aí ela botava comidinha, porque o corvo sempre vinha no mesmo horário, porque ele não é besta, e aí ela começou a ganhar presentinhos do corvo. O corvo chegava com alguma coisa no bico, deixava lá, comia a comida e ia embora. E aí tem uma grande coleção, tem uma foto, e aí tem várias coisas brilhantezinhas. Sempre ele trocava comida…
Marcos Keller: Isso se chama receptação de produto furtado.
Leonardo: Mas, na verdade, isso aí não foi bem tipo uma amizade, ele estava fazendo uma troca ali, um comércio.
Marcos Keller: Comércio, aí, olha.
Leonardo: Olha a versão do Odin comerciante aí. Mas interessante que essa questão aí do corvo ser um dos animais que está junto do Odin, mas tem outros – a gente falou dos aspectos dele -, como os lobos, Geri e Freki, que simbolizam a gulodice. Isso eu achei interessante também. Eles são usados na caçada. Os corvos, por mais que tenham essa imagem que estão ali, chega a noite e contam a fofoca para o Odin, também estão relacionados com esse conceito de morte e tudo, de cadáver, mas esses lobos estavam também ligados à questão de morte, porque eles estavam relacionados às caçadas dele. Então aquela ideia do Odin ir para o campo de batalha ali, onde estavam os povos batalhando, para chamar os que iriam para o lado no pós-vida, tudo, tem os lobos que ficavam ali se alimentando. Eles se aproveitavam e pegavam o rango deles.
Marcos Keller: Eu acho interessante quando fala sobre a questão dos lobos. Se você fizer uma análise cultural mesmo, o lobo é um bicho que é extremamente gregário e (inint) [00:25:34] por força, quem é o mais forte, quem é o alfa da alcateia. E você ter um personagem, uma pessoa que doma dois lobos e tem esses dois lobos que são conhecidos pela gulodice e pela violência para a caçada e os dois estão domados, quer dizer que ele é o alfa. Odin, nesse ponto, se posiciona como alfa. Então isso diz muito a respeito da realeza, do poder de controle e da ferocidade da personagem.
Leonardo: O problema é que eu vejo, quando pesquisando esses dois lobos, falando que são símbolos da gulodice, então, tipo, eu não consigo… apesar de eles serem relacionados às caçadas, eu não consigo imaginá-los com corpo de lobos caçadores e tudo assim, eu imagino aqueles cachorros gordões, aqueles cachorros que não andam direito, já estão, tipo, virando um botijão.
Marcos Keller: Então, isso aí é um erro de tradução. A Ju me ajuda aqui. Sabe por quê? Quando a gente fala dessa gulodice, não necessariamente é o sufixo de gula, pode ser aquele só de ter mais, que é o mesmo da luxúria, o lust.
Ju Ponzi: É.
Marcos Keller: Que eu só quero derrubar mais, eu quero caçar mais, eu quero molhar minha boca com sangue. Não quer dizer que eu quero comer.
Ju Ponzi: É isso aí mesmo.
Marcos Keller: Porque tem o termo, o lust não precisa ser, tipo, luxúria por sexo, pode ser lust for blood, eu quero sangue; lust for money. Então pode ter essa tradução também. Ou podem ser dois gordinhos mesmo.
Leonardo: É que eu fiquei pensando agora no meu cachorro mesmo, porque ele está assim, está virando um botijão, então ele pode virar um símbolo da gulodice que nem eles. E um terceiro animal que está relacionado ao Odin é o Sleipnir, que é a montaria do Odin, e isso está muito ligado à velocidade do deus, à questão de ele ir para inúmeros locais, tudo, porque ele é um cavalo de oito patas. Então ele pode ir pela terra, pelo ar, e seria extremamente rápido.
Ju Ponzi: Eu lembro que tem uma coisa muito interessante do Sleipnir. Na realidade, o fato de ele ter oito patas seria uma representação de caixão – não de um caixão que nem a gente conhece hoje -, uma representação de homens carregando um corpo de um morto, mas a galera liga esse lance de ele ter oito patas, de eles serem, tipo, quatro homens carregando este guerreiro até o mundo dos mortos. Eu falei: “Caralho, parece uma coisa muito legal mesmo”.
Marcos Keller: Eu acho que é importante falar do rolê de ser sobrinho do Odin.
Ju Ponzi: Ah, gente, mitologia nórdica é aquele negócio maravilhoso, onde as pessoas dão a luz a cavalos, a animais, as pessoas também conhecem os animais no sentido bíblico, têm filhos com animais, e vocês, como estão aqui no Mitografias, já devem saber que grande parte de toda esta maravilhosidade vem do Loki, não é? O Loki também tem todo um rolê de estar com animais. Mas, gente, Sleipnir é filho do Loki, cara.
Marcos Keller: É importante lembrar disso. O Loki é a mãe.
Ju Ponzi: Exato. Porque o Loki, para que pudesse gerar Sleipnir, se transformou em uma linda eguinha, que não é a Pocotó, mas ela era branquinha, muito bonitinha, e aí gerou o lindo do Sleipnir. Isso é o mais louco, cara, porque Loki que gerou, exatamente, ele é a mãe.
Leonardo: E ele acaba dando esse cavalo, o filho dele, de presente para o Odin. E aí a gente tem alguns outros itens relacionados ao Odin. Um que eu não vejo tanta representação, pelo menos não tanta ênfase em coisas mais recentes, é o anel dele. E o interessante que é que nem falar: “Odin tem um anel”. Não se fala tanto, é mais a lança, algo assim, a representação; o anel é algo do mais simples, de certa forma. Mas esse anel dele é um anel de ouro e é mágico, e a cada nono dia outros anéis surgiam dele, que é o anel de Draupnir, e a cada nove dias oito anéis surgiam, então ficavam nove anéis e ia aumentando. E a representação dessa ideia de o Odin ter um anel é uma representação antiga. Todas essas outras representações podem até ter vindo depois, agora, o anel é uma coisa bem antiga ali do Odin. E aí tem toda uma discussão da importância que o anel tinha para os povos nórdicos. Porque isso que é muito do Odin: o que você vê no Odin… toda divindade tem essa de ser o reflexo da humanidade, mas o Odin, por ter alcançado o nível de deus supremo, de ele ser reverenciado assim, então ele seria uma das divindades que mais tem isso. Então por isso que ele é um deus da guerra, mas ao mesmo tempo ele tem a questão da estratégia, porque você não poderia ser um viking só porradeiro, você teria que ter estratégia para sobreviver. Então todas essas características do Odin representam isso. E aí o anel é isso: ele é algo bem antigo. E aí fica esse estudo. Por ser antigo, acaba sendo difícil de entender realmente o que o anel queria dizer, mas ele é um dos elementos que o Odin tem.
Marcos Keller: Eu já vi algumas versões do Draupnir, o anel do Odin, que ele está justamente… a opulência e a facilidade de conquistas, porque ele está ligado à riqueza. O próprio termo do Draupnir é aquele que pinga, drop, vem da gota mesmo. Ele é de muito valor, ele é dourado ou de prata – acho que às vezes é retratado como prata também, mas eu me lembro dele dourado – e ele se multiplica justamente multiplicando a riqueza. Eu acho que tem alguma ligação com o Anel dos Nibelungos, mas…
Ju Ponzi: Tem toda, porque tem uma treta lá do Odin colocar esse anel. Quando o Baldur se foi, ele pegou e colocou o anel da pira funerária – ai, que difícil falar isso: pira funerária – onde o Baldur estava sendo queimado, porque tinha muita gente falando para ele: “Se livra desse anel, esse anel é bizarro. Como assim o anel fica criando outros? Esse bagulho está muito bizarro”, e aí, quando ele decide colocar esse anel lá na pira, começa a tal da maldição do anel. Maldição do anel não, desculpa, da maldição do ouro. Gente, qualquer semelhança com Senhor dos Anéis não é mera coincidência. Mas, se você quiser olhar isso no Anel dos Nibelungos, e tem todo aquele lance que é uma ópera do Wagner e tudo mais; também, se você for procurar na Edda, também tem coisa sobre os Nibelungos, falando sobre isso e sobre a maldição que aconteceu depois dessa tentativa de se livrar deste anel. Então tem tudo a ver, você está corretíssimo.
Marcos Keller: E também tem aquela coisa, o Wagner faz uma reinterpretação, então eu não tenho certeza onde é o tradicional mitológico.
Leonardo: O problema é que tem também vários tradicionais mitológicos. Falando rapidamente para o ouvinte: o da Wagner estaria de pau a pau com o Senhor dos Anéis, por quê? Porque os dois são obras fictícias que se basearam no Anel dos Nibelungos. O Anel dos Nibelungos já é algo mítico, mas ele é baseado já em outros mitos nórdicos, que é aí que vem já o anel do Draupnir. O Anel dos Nibelungos, você pode ver que ele já é mais estruturadinho, tem algumas versões que você já encontra até mais conceitos históricos, colocam uns reis de não se onde, algo mais pé no chão, que é uma transição que as narrativas nórdicas têm. Isso não se prende muito aos nórdicos, mas os nórdicos são um bom exemplo disso. Quanto mais antigo tem, mais é relação com os deuses e mais mítico, você não tem tanto herói, tanta coisa histórica, e, conforme vai passando o tempo, para ter aquela validação, tipo, “Eu sou tataraneto do grande herói tal”, então coloca esse grande herói tal, tipo o Siegfried, tudo assim: “Eu sou descendente dele”, e o coloca com uma relação em uma narrativa que tem relação com Odin, que aí já é o Anel dos Nibelungos. O Wagner e o Tolkien já são totalmente fictícios.
Ju Ponzi: Exatamente. O que a gente não pode esquecer, que é muito importante: o lance do anel associado com Odin tem aquela história conhecida que existiam dois ferreiros lá que trabalhavam, que estavam meio que com contato direto com os deuses, que eram o Brokk e o Eitri, que eram dois anões, e eles eram ferreiros muito fodas. E aí eles fizeram, digamos assim, uma coleção de três grandes presentes – um dos presentes era o anel, era o Draupnir. O outro segundo presente era o Mjolnir, que era o martelo do Thor, e o terceiro presente era um javali de ouro gigante, que se chamava Gullinbursti. Mas o anel fica conhecido na mitologia porque ele é um desses três presentes maravilhosos fabricados pelo Brokk e pelo Eitri lá, que eram os grandes ferreiros muito fodas que faziam as coisas mais maravilhosas de tudo lá. E aí obviamente tem uma história do Loki desafiando os dois, enfim, Loki está sempre lá tirando todo mundo do sofá, é uma grande pessoa.
Leonardo: E um outro item que o Odin utiliza é a lança Gungnir, que até hoje eu acho que essa lança tem alguma relação com a outra lança céltica, aquela lança que não erra, porque, se não me engano, essa lança do Gungnir também tem um negócio assim, de ela ser sedenta por sangue, de ela sempre acertar, tudo que é bem estilo dessa lança céltica.
Ju Ponzi: Você está certo, ela nunca erra. Além de nunca errar o alvo, Gungnir sempre volta para a mão de Odin, ela é tipo bumerangue. Ela não é só uma lança.
Leonardo: O que é interessante no estudo sobre a lança do Odin… os historiadores, o pessoal que vai atrás disso aí falam: “Espera aí, por que diabos ele tem uma lança?”, porque ele é uma divindade real, da realeza – uma divindade real o pessoal vai achar que existe. É uma divindade da realeza. Realeza… guerreiro nórdico vai estar com uma espada, a espada é uma… isso não só nos nórdicos, isso em muitos locais, é a representação ali da realeza. E por que diabos está com uma lança? Então fica toda uma discussão do porquê vai usar isso. Apesar de que às vezes você vê o Odin com uma espada, sim, não tem problema isso, mas por que essa lança é tão forte na representação dele? Então tem toda uma pesquisa atrás disso aí.
[Trilha sonora]
Leonardo: E um outro aspecto que eu acho que esse é um… não sei se talvez seja um dos mais fortes, mas pelo menos é um dos que mais me chama a atenção, que eu mais gosto na divindade, e eu acho que é algo muito a se espelhar, porque está muito voltado para nós humanos, que é a ideia dos sacrifícios dele. Isso eu acho muito legal, porque o Odin é um deus fodão, rei ali supremo, lidera tudo, mas mesmo assim, para ir atrás das coisas, ele teve que fazer sacrifício. Ele nasceu só em berço de ouro e acabou tudo, não, as coisas que ele foi atrás teve que lutar, teve que ir atrás, se sacrificou pelo que ele queria. Isso eu acho muito emblemático.
Marcos Keller: Uma coisa que eu acho muito legal sobre a questão do sacrifício assim é que o Odin, ainda como Wodin, e seus irmãos Vili e Vé, são três entidades que ajudam na construção do mundo a partir do cadáver do gigante. Então ele é um deus que está lá no começo da criação, só que ele faz uma série de coisas para manter a supremacia, e, para poder manter a supremacia, uma das principais é adquirir poder e sabedoria ao longo do tempo. Então ele é meio que superado pelos Vanir, mas aí ele tem que garantir poder sobre os Vanir, e ele faz isso sempre para não ficar para trás. E eu acho que aí você tem mais uma coisa para entender sobre essa gula representada pelos lobos: ele está sempre correndo atrás das melhores armas, do melhor desenvolvimento e do melhor conhecimento. Mas eu estava conversando com um amigo esses dias, amigo meu, amigo da Ju, o (inint) [00:38:13]. Passei um pedaço de um fim de semana aí atrás conversando com ele também, e uma das coisas que ele estava falando assim, já com o hidromel abençoando seus pensamentos, foi que ele disse que ele parou assim e falou assim: “Cara, eu acho que Odin não sabe fazer negócio ou ele era muito desesperado”, eu falei: “Por que, cara?”, ele falou assim: “Porque, para para pensar, às vezes, quando você lê a…” – aí ele fala um nome muito doido, porque ele estuda a parada da língua germânica clássica também e tal, então ele e a Ju adoraram conversar -, e aí ele mandou uma assim: “Porque você pega lá no texto quando ele vai atrás da sabedoria para Mímir, Mímir ainda não tinha fechado acordo com ele…” – Mímir é uma cabeça em um poço assim – “… e ele chegou para Mímir e falou: ‘Eu quero a sabedoria’, e Mímir falou ‘Tudo bem, vamos ver aí’, ele falou assim: ‘Não, eu te dou o meu olho'”.
Leonardo: É verdade.
Marcos Keller: Aí o Mímir olhou e falou assim: “Porra, eu não ia pedir nada, está ligado? Mas já que você vai me dar o olho, beleza, mano, me dá aí”. Aí ele falou: “Não, mas eu te dou o meu olho, aqui, olha, toma o olho”, aí o Mímir falou: “Beleza, manda o olho aí, então. Eu ia cobrar cinco reais pela sabedoria, você quer pagar 100, o problema é seu”. E aí é justamente essa sede para manter uma supremacia, para desenvolver aquilo. E é muito louco que, depois disso, você vê que os próximos sacrifícios que ele faz são um pouquinho mais, tipo assim, compreendendo valores. Quando ele vai fazer o sacrifício para poder ter acesso às runas, é mais calculado. Ainda é um sacrifício pesado, é o mais pesado dos sacrifícios, mas ele é calculado, ele sabe que ele aguenta, entente? Ele sabe que ele resiste, não é só meteção de louco. Então eu achei muito legal esse raciocínio, porque é uma coisa que eu não tinha pensado, sabe?
Leonardo: Ele estava ansioso com aquilo já. Eu entendo o Odin, o Odin era um deus um tanto quanto ansioso.
Marcos Keller: É gente como a gente, não é?
Leonardo: É. E tem esses dois, que é essa questão com o Mímir, que ele faz para ter a sabedoria, e o segundo, que ele se coloca, se prende com a lança na Yggdrasil para conseguir as runas. O Odin também é um deus das runas. Vocês aí que contratam o serviço da Ju como runóloga, agradeça a Odin.
Ju Ponzi: É verdade.
Marcos Keller: Sempre que você se desenvolve com as runas, indiretamente é com ele que você está trabalhando ali. Está vendo, isso explica muita coisa. Quando você pensa as runas como um objeto de autoconhecimento e de conhecimento da realidade em volta, elas te ajudam a controlar a ansiedade. Está muito ali, olha, você entende por que ele foi atrás das runas depois.
Leonardo: Você vê, é isso que eu falo também. O Odin, o que ele quer, ele vai atrás, nem que ele tenha que dar o olho por causa disso, mas sem ser tipo o Loki, que o Loki muitas vezes faz as coisas para se salvar. Deu emrda ali, fez alguma coisa, tudo, “Agora preciso…”, a questão do filho dele, do Sleipnir, todo o mito é relacionado a isso, sabe? Ele tinha que resolver algum problema ali. O Odin não estava com um problema necessariamente ali para “Não, preciso pegar a sabedoria do Mímir, eu preciso dar runas”, não. Para ele, ele precisaria, mas não era um problemão ali que teria que resolver assim, mas, na cabeça dele, realmente precisava daquilo, ele foi obstinado até aquilo e se sacrificou por isso.
Marcos Keller: É, ele paga preços. Lembrando que a gente tem um episódio aqui na casa específico sobre runa. Quem quiser dar uma olhada, a gente conta direitinho a origem das runas lá também, estamos eu, a Ju.
Leonardo: Lá a gente se aprofunda mais, então, se vocês quiserem saber dessa relação de runas, de realmente o que é cada uma das runas, tudo, a gente explica lá certinho. Vamos deixar o link. E, como todo deus-rei, precisa também da sua deusa-rainha, e aí, no caso, o Odin é casado com a deusa Frigga, que também traz um aspecto de sabedoria. A Frigga tem toda uma complexidade também, mas ela também traz muito esse aspecto de sabedoria, e aí ela fica voltada às questões femininas mesmo. Fica muito nisso aí, o Odin com esse lado masculino e a Frigga com o lado feminino mesmo. Com ela, ele teve alguns filhos, como o Balder e Hoder. O Hoder agora, de cabeça, eu não lembro quem é, não lembro se é o cego; Balder é um dos deuses mais famosos que tem aí, é praticamente um deus paladino em si. Enquanto tem todos os deuses aí guerreiros, tem o Thor sendo bem agressivo, tudo, o Balder é bem aquele cara centrado, aquele herói. O Balder é voltado à guerra, mas é o herói.
Ju Ponzi: O Hoder era, sim, cego. Você tem razão quando você falou.
Leonardo: Então olha só que interessante, Balder e Hoder são os irmãos e é o que o Loki usa para atingir o Balder. Na história em que o Balder morre, o Loki pega uma divindade cega e fala: “Olha, aponta para ali. Você também pode participar…”, porque estava um monte de gente jogando coisa no Balder, já que o Balder estava ali se mostrando: “Sou invulnerável”, e aí o Loki sabia o que poderia causar dano no Balder, vai lá até o Hoder e fala: “Olha, atira ali, aponta aqui. Você não enxerga bem, mas eu vou te guiar: aponta ali e joga”, aí jogou a flecha e acertou o Balder e matou. Então foi o próprio irmão. Bom, e algo também comum de mitologia é uma divindade não se contentar apenas com uma esposa. E aí o Odin teve outros casos amorosos.
Marcos Keller: E antes de você criticar, lembre-se que o Loki teve um filho com um cavalo. Aqui o bagulho era mais livre.
Ju Ponzi: Já vou entrar aí no lance do “Temos várias aventuras amorosas”. De novo: existe outro historiador que disse o seguinte, que esse lance de ele ter muitas aventuras amorosas e pegar geral, não sei o que, não sei o que lá, na realidade, é muito uma influência do que você tem da antiguidade clássica, porque o jeito de contar história e de registrar a história estava primeiro por ali por Zeus, pela narrativa de Júpiter, e aí meio que falaram assim: “Ah, Odin é meio esse cara, não é? Ah, então vamos colocar aqui também que ele teve várias aventuras”. Então dizem que, na realidade, tudo isso veio muito posteriormente, esse lance de que Odin é o cara que passa a régua, para não falar outra coisa, em todo mundo.
Marcos Keller: O entendimento literal do título de pai de todos, que, na verdade, não é pai biológico. Não necessariamente.
Ju Ponzi: Não é o Mr. Catra, gente.
Marcos Keller: É, pelo amor de deus. A mitologia grega foi essa bagunça mesmo, cara, todo mundo é filho de Zeus porque cada cidade falava que Zeus tinha um filho com alguém e tal.
Leonardo: Para validar, não é?
Marcos Keller: Então eles só compilaram isso.
Leonardo: Juntou tudo. Mas é interessante isso aí do Odin ter esse aspecto por, na verdade, quem registrou ter ali influência clássica e tudo. Isso é bem forte, porque você encontra outros aspectos no Odin os quais você pode comparar com os gregos, isso até uma das próprias mulheres dele, que aí no caso é a Jörd, que é a deusa da Terra. E, quando você vê representações dela, ela é Gaia. Gaia não teve nada em relação com Zeus, mas elas por si sós, Gaia e Jörd, são muito semelhantes, tanto que até no dos Nibelungos – se não é no dos Nibelungos, é alguma história meio relacionada a isso… eu lembro bem quando eu estava lendo isso aí, que aí você vê: o Odin queria fazer tal coisa e a Jörd deu uma puta bronca nele, sabe? Mostrou que a Jörd estava meio que acima do Odin, era esposa ali e não abaixaria a cabeça para ele. Não que a Frigga fizesse também isso, mas mostrava que era mais fácil ele abaixar a cabeça para ela. E, quando a gente vai para os gregos, Gaia está acima de qualquer um praticamente. Gaia dava umas broncas em Zeus falando: “Olha, você prendeu aqui meus filhos e tudo, na época dos Titãs. Vai vir alguém que vai enfrentar você, vai vir algum descendente seu e vai pegar seu poder”, ela previa essas coisas e ela estava, tipo, acima dele. Jörd tem muito esse aspecto de não ser abaixo de Odin. O que tem-se uma ideia de que ele é o deus supremo, então ele tem que ter alguma relação com a Terra, porque ele é o que vai comandar, é o rei. Todo rei tem que se relacionar com a sua terra. Então nisso que também tem essa ideia de colocarem ele relacionado com ela, que, inclusive, foi bem importante, porque dali que Thor. Thor é filho de Odin com Jörd, não é filho com Frigga, como muita gente pode imaginar (inint) [00:46:59] ser o casamento ali mais conhecido, mais tradicional. O Thor é filho da deusa da Terra. Inclusive, isso traz o aspecto de o Thor ser um deus da agricultura.
Marcos Keller: Eu acho muito legal, cara, essas visões que a gente pode ter também. E outra que a gente também tem que entender que existem várias possibilidades, mas a gente não tem absoluta certeza sobre como era a vida relacional e amoroso desses povos antigos, especialmente porque foram muitos povos que adoraram e tiveram prestação de culto à figura de Odin, então é difícil saber quais são as referências.
Ju Ponzi: A gente coloca e julga o rolê com uma visão, com um recorte histórico, que é o de hoje, que: “Ah, existem famílias”, e inclusive está mudando – que bom, para não ficar do mesmo jeito o tempo todo -, e a gente tem esse defeito de falar: “Ai, que absurdo esse homem passando aí a…”. Não vamos esquecer o episódio de Freya, mas Freya também passou a régua em várias pessoas aí e com troca de presentes: “Você me dá isso aqui que eu te dou outra coisa muito preciosa que eu tenho”, ganhou vários presentes com isso.
Leonardo: O da Freya é o que estaria digno de estar em alguns sites aí, não é?
Ju Ponzi: E é isso aí, gente, não pode olhar com recorte que a gente tem hoje, não, tem que simplesmente ouvir a história e aproveitar, cara.
Leonardo: Ainda nessa comparação que dá para fazer com o Odin ou então até a mitologia nórdica com a grega, a gente tem um outro aspecto que, quando você vê, realmente não tem como não fazer uma comparação, é a questão dos disfarces que o Odin utilizava. Como ele era um deus peregrino, ficava para lá e para cá, então ele estava ali viajando e disfarçado muitas vezes, e aí ele usa… uma das representações que eu acho mais legal, que é ele com um chapeuzão de abas largas, um lado às vezes até cobria um dos olhos dele, e com uma capa, muitas vezes uma capa azul ou uma capa cinza. É essa versão que o Gandalf nasceu de aí.
Marcos Keller: Se você quiser, ouvinte, vá agora aí no seu navegador de preferência e você pode digitar o nome Georg – Georg com G mudo – von Rosen. Você vai ver um quadro feito por ele, sei lá, 1800 e alguma coisa, quase 1900, chamado Oden som vandringsman, que é o Odin, o viajante, que é o Gandalf todinho.
Leonardo: Por que aí eu disse de comparar com o dos gregos? Porque isso também era muito comum na mitologia grega, de o Zeus estar ali. Aí o Zeus usava para duas coisas essa questão de disfarçar: um, para testar os humanos, ver ali se o aceitavam, porque no grego tinha isso aí, você tem que aceitar o viajante ali, o hóspede; e também para passar o rodo. Eram esses dois aspectos que Zeus usava. E aí a gente vê também o Odin fazendo isso, de ir andando por aí com esse disfarce.
Marcos Keller: Mas não tinha esse conceito que a gente tem, cristão, de falar assim: “Ah, não, deus está aqui no meu coração”, não. No caso, é muito físico, então eles estavam andando por ali.
Leonardo: Isso é legal, porque é a imagem que se coloca disso, tanto que ele está ali naquele ponto específico e, quando ele não está ali na Terra e tudo, ele está no trono dele olhando os nove reinos, mas até ele precisa dos dois corvos para irem lá informá-lo. Então você vê que é algo mais localizado, é uma forma diferente de a gente ver esse deus atual que está onipresente.
Marcos Keller: E tem um outro título dele que está relacionado a isso, que é o título de Grímnir, que é o disfarçado, aquele que disfarça, não é?
Leonardo: E esse é um dos Odins que eu mais gosto ali, porque mostra… eu acho que traz aquele aspecto que eu falei desde o começo, de ele ir até as coisas ali. Sabe? Ele não está ali só sentado no trono reinando e acabou, “Já conquistei tudo e já era”. Não, ele está realmente andando para lá e para cá, está vendo. Dependendo da época em que você for pegar, ele está até aprendendo. Então eu acho muito legal esse aspecto.
Marcos Keller: E eu vou te falar que eu gosto muito da imagem do Odin, eu fiz inclusive um quadro uma vez sobre Odin nessa transição de guerreiro para velho, sabe? Para o viajante. Ele está nessa transição, então ele ainda está fortinho, ainda está bacana, está com o elmo de batalha ainda, mas ele já está nessa transição. Eu acho muito bom isso, porque é justamente para dizer que, se você não tem mais, sei lá, constituição física para batalhas constantes, porque quem substitui ele nesse trabalho acaba sendo Thor, e em outras questões, ele ainda tem muito a fazer. Cada idade tem algo que pode ser feito, cada momento da vida tem um papel que você pode desempenhar. Eu acho isso muito legal.
Leonardo: O Odin ainda tem isso, ele tem vários papéis. É porque a gente está muito acostumado com essa ideia de ele de barbão ali, reinando, com a lança e tudo mais, mas ele tem… se você for pegar, tem o Odin criador, tem o que saiu nas aventuras com o Loki, com outros deuses lá, que enfrentou gigantes, tem o Odin que reina, tem esse Odin peregrino, o que se sacrifica. Então são vários e vários Odins.
Marcos Keller: É isso que eu acho mais belo na figura do Odin. Não são todos, por exemplo, Thor é meio chapadão, meio 2D, mas você pega alguns outros… até porque ele é meio tapado, não é? Se você for ver dentro da mitologia… o Loki mesmo é outra divindade complicadíssima. Tem alguns que são bem complicados, isso eu acho muito belo.
[Trilha sonora]
Leonardo: No episódio todo aí a gente falou de diversas características de apresentações do Odin, o que ele significa, as várias versões em si, mas aí eu queria ver o que vocês acham do Odin, já que a gente ficou rasgando seda dele aí no episódio inteiro.
Marcos Keller:Ele é meio escroto, não é? Vamos lá, há de convir.
Leonardo: Sim, sim, sim. Ju, o que você curte do Odin? O que te chama a atenção? Principalmente você mexendo com runas.
Ju Ponzi: Pois é, vamos lá. Uma coisa que, nos meus estudos de Odin, aprendi, e o lance das runas também tem muito a ver com isso, e é uma coisa cultural também – a gente precisa entender isso como um construto cultural também lá das terras de cima -, é ser direto. Odin sempre passa uma mensagem direta. Às vezes, a mensagem direta dele é direta demais, ele já chega dando uma voadora de dois pés, inclusive nas histórias da mitologia. Mas eu acho que a coisa mais legal é isso: você às vezes fala: “Putz, que choque, tomei esta paulada”, mas depois a coisa parece que melhora demais, sabe? Receber a mensagem. Eu acho que esse lance de ele ser direto é uma coisa que me agrada. Uma coisa que eu gosto muito de Odin, que a gente não falou aqui e eu vou relembrar muito rapidamente, é o seguinte: vamos lembrar dos (seidr) [00:54:07], que a gente falou também no episódio de runas, que é um lance puramente feminino, é uma prática mágica puramente feminina, e aí Odin chega e fala assim: “Eu quero saber como é que faz esse rolê aí, você me ensina?”, chegou para a Freya, e Freya ensinou. Então muita gente foca o lance do Odin: “Uau, Odin é bruto”, mas Odin também brinca um pouco com esse construto masculino e feminino, a agressividade de ser um lance, porque ele também caminha por este lado, o lado que tem a ver e que as pessoas atribuíram culturalmente depois, que é a intuição, o feeling, de ser uma coisa estritamente feminina, e não, ele tinha isso também nele. Eu acho isso muito foda. Eu acho que ele segue os dois caminhos de uma forma bastante equilibrada, segundo as histórias da mitologia. Eu acho isso muito interessante na figura do Odin. E isso é uma coisa… aproveitando que temos um xamã urbano aqui, Marcos Keller, eu acho que isso é uma das chaves maravilhosas do xamanismo, inclusive.
Marcos Keller: Totalmente. Eu estou fechando bastante com essa sua fala, inclusive, só para ter uma discussão a respeito disso tudo, teve um tempo que eu dei uma olhada em um comentário, que eu estava conversando com alguém, e alguém me passou que Odin admira muito as batalhas diárias, os vários sacrifícios para ser quem você quer ser, a construção daquilo que é o seu ser, e, se tem uma coisa que eu tenho certeza que terá no Valhalla é uma galera LGBT, que é quem está tendo essas batalhas hoje em dia, entende? Ah, que dificuldade que é ser hétero padrão, branco, no mundo atual. Porra, você não está lutando, irmão? Tomar cerveja artesanal e cortar cabelo na barbearia com nome de mafioso não faz de você porra nenhuma, mano. E é legal levantar esse tipo de questão, porque foi uma das discussões que eu vi, e tinha uma bandeira com um daqueles símbolos tríplices da mitologia nórdica com as cores LGBT em um canto e tal. E eu acho que, porra, está super ali. Eu acho que é bacana lembrar que… o nome da magia acho que é seidr, que era considerada não para homens…
Ju Ponzi: É isso mesmo.
Marcos Keller: … reservada apenas para as mulheres, não é?
Ju Ponzi: É isso mesmo.
Marcos Keller: Porque envolve rito sexual passivo, se eu não me engano, e ativo, e tal, e até nego quis insultar o Odin. O Odin falou: “Porra, foda-se, eu estou aprendendo, eu estou desenvolvendo isso”. Então é muito bacana você pensar nessa questão. Então você que pertence a alguma dessas minorias de batalha, Odin zela pela sua figura também, viu? Ele é bruto e essas paradas todas, mas ele não tem o ideal de macho moderno. Isso é importante lembrar. Na verdade, ele desceria porrada nesses machos modernos também sem problema nenhum. Eu tenho um brother, o Jasão. O Jasão é um professor, amigo meu. Imagina que louco, é um cara negro, cego de um olho. Ele tem um olho cego que de vez em quando eu brinco que ele é o black Odin, e ele é gente boa para caralho, inteligente para a porra, e ele é um dos caras que, quando aparece neonazi falando alguma coisa de mitologia nórdica, ele fala: “Mano, qualquer nórdico ia olhar para você e falar assim: ‘Nossa, quem é esse jovem de pele macia?’, e, de duas umas, ou ele ia bater em você ou… ia descer porrada e pegar teu lanche, numa boa, e você não ia fazer nada”. Então é uma discussão interessante para se levantar, que muito da questão nórdica, principalmente deuses nórdicos, não é validada por raça, tanto que é que você tem uma maluquice de raças e espécies guerreando e confraternizando entre si quando você fala sobre a mitologia nórdica. Então isso é uma coisa extremamente moderna, que cai depois daqui. E, quando a Ju falou sobre a questão da modernidade, Odin é uma divindade que está muito relevante na modernidade ainda. Acho que é por isso que continua viva com tanta força, a figura dele, justamente porque é um cara que está sempre se adaptando, ele é o cara que faz o que pode para estar na supremacia. Quem capturou isso muito bem foi o próprio Neil Gaiman, no Deuses Americanos – para quem leu o livro, não vou dar spoiler da série agora, ou vou, porque acabou, não é mais Deuses Americanos, é só Americanos agora, acabaram-se os deuses, acabou-se o rolê multiétnico que tinha naquela parada. Que é isso, tudo, na verdade, é um grande joguete que Odin está no meio. Eu acho isso muito bacana, que é a questão da sobrevivência mesmo, e isso é a coisa que eu mais admiro nele, é a questão da sobrevivência.
Leonardo: Tudo isso aí é o que me chama a atenção, porque eu acho que o Odin… vendo… aquela pessoa que não conhece nada de mitologia nórdica e tudo, vê por alto, assim, vai ver esse Odin guerreiro, no lado literal mesmo, ele com a lança e tudo, está indo às guerras. E eu sempre pensei: “Meu, beleza…”, eu gosto, eu sempre gostei do Odin porque eu conheci mitologia pela mitologia nórdica, então sempre foi uma das primeiras divindades que eu conheci, então legal, mas eu sempre parei para pensar assim: “Mas não me representa em nada”. Mas, quando você começa a pesquisar mais a fundo, que você vê aquele Odin peregrino indo atrás da sabedoria, tendo que se sacrificar pelo que ele quer, ele põe na cabeça o que ele quer, vai até aquilo lá, tem que se sacrificar. Você vê que a parte guerreira dele não é simplesmente ir para a batalha e acabou. Como a gente mostrou no episódio, Odin é mais do que isso, e é esse lado do deus da sabedoria que me chama muito a atenção. É aquele Odin daquele quadro que o Keller falou, que o mostra com um chapéu, com um cajado. Esse Odin é o que me chama muito a atenção, sabe? Por causa disso, ele é uma divindade suprema ali, rei, mas ao mesmo tempo ele está tendo que fazer sacrifícios, e é o que eu trago para a minha vida, tipo, “Pô, eu quero tal coisa? Eu vou atrás. Não vou desistir daquilo lá, mas eu sei que aquilo lá vai ter sacrifícios. Eu preciso pôr na minha cabeça que vai ter sacrifícios”. Esse aspecto do Odin que eu trago para mim, por isso que eu gosto muito dele. E você, ouvinte, que gosta aí também do Odin, que viu mais detalhes aí, diz aí também o que você gosta muito dele aí, o que te chama a atenção, como você ficou conhecendo a divindade, quais aspectos dele que te chamam muito a atenção. Comenta aí. E, Keller, Ju, algo mais?
Marcos Keller: Não, acho que é isso mesmo.
Ju Ponzi: Também acho que é isso.
Leonardo: Então a gente fica por aqui. Espero que Odin cuide de vocês, mas tome cuidado aí, que não pode ficar confiando muito, não.
Marcos Keller: O bicho é ligeiro.
Leonardo: Então é isso e até mais.
Marcos Keller: Tchau.
Ju Ponzi: Até.
[Trilha sonora]
[01:02:03]
(FIM)