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Nesse episódio do Papo Lendário, Leonardo Mitocôndria, Nilda Alcarinquë, Juliano Yamada e Pablo de Assis conversam sobre o mito do Minotauro.
Entenda nesse episódio que se você prometer algo aos deuses, cumpra! Mas ainda assim tenha cuidado.
Conheça a origem de Minos e do Minotauro.
Ouça sobre os demais personagens que estão ao redor do mito do Minos.
Aprenda como vencer o Minotauro apenas com bolinhos de chuva.
– Esse episódio possui transcrição, veja mais abaixo.
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— LINK —
Manual dos Monstros 03 – Minotauro
— EQUIPE —
Pauta, edição: Leonardo Mitôcondria
Locução da abertura: Ira Croft
Host: Leonardo Mitôcondria
Participante: Juliano Yamada, Nilda Alcarinquë e Pablo de Assis
— APOIE o Mitografias —
— Agradecimentos aos Apoiadores —
Adriano Gomes Carreira
Alan Franco
Alexandre Iombriller Chagas
Aline Aparecida Matias
Ana Lúcia Merege Correia
Anderson Zaniratti
André Victor Dias dos Santos
Antunes Thiago
Bruno Gouvea Santos
Clecius Alexandre Duran
Domenica Mendes
Eder Cardoso Santana
Edmilson Zeferino da Silva
Everson
Everton Gouveia
Gabriele Tschá
Hamilton Lemos de Abreu Torres
Jeankamke
Jonathan Souza de Oliveira
José Eduardo de Oliveira Silva
Leila Pereira Minetto
Leticia Passos Affini
Lindonil Rodrigues dos Reis
Mariana Lima
Mateus Seenem Tavares
Mayra
Nilda Alcarinquë
Paulo Diovani Goncalves
Patricia Ussyk
Petronio de Tilio Neto
Rafael Resca
Rafa Mello
Talita Kelly Martinez
— Transcrição realizada por Amanda Barreiro (@manda_barreiro) —
[00:00:00]
[Vinheta de abertura]: Você está ouvindo Papo Lendário, podcast de mitologias do projeto Mitografias. Quer conhecer sobre mitos, lendas, folclore e muito mais? Acesse: mitografias.com.br.
[Trilha sonora]
Leonardo: Muito bem, ouvintes. No episódio anterior, a gente conversou sobre os minoicos e como eles são anteriores aos gregos. A gente falou da religião deles e tudo mais. Mas, quando a gente fala de Creta, que é a ilha dos minoicos, e de mitologia, a gente acaba lembrando do mito do Minotauro, que vai ser o episódio de hoje. E, com isso, eu estou aqui com a Nilda…
Nilda: Olá.
Leonardo: … com o Yamada…
Juliano Yamada: Alô, você.
Pablo: Oi, oi. Leonardo: Dessa vez, como disse, a gente vai falar do mito do Minotauro, e aí, no caso, esse já é realmente algo grego. No caso, até se relaciona à Atenas, à cidade de Atenas, tem a ver com o herói Teseu. Então isso vem depois do que a gente contou no episódio anterior, que a gente falou do auge e da queda dos minoicos; agora já é um mito relacionado ao povo grego. Mas, como a gente tinha falado no episódio anterior, a gente mostrou muito da importância ali do touro que tem para os minoicos, toda a imagem em si que tem, e aí, nesse caso, você ver essa imagem do touro no Minotauro. Não só no Minotauro, mas a gente vê isso nos cretenses, no caso. E interessante, porque a gente vai mostrar essa narrativa do mito do Teseu e o Minotauro – é conhecido dessa forma, o Teseu sendo o herói e o Minotauro o monstro, o desafio ali -, mas a gente nem precisa ficar falando em si do Teseu. Na verdade, o Teseu nem é o foco aí do episódio de hoje. Hoje é a parte voltada para Creta: o rei Minos e o Minotauro. Porque Creta, em geral, já é algo que tem bastantes características, tem bastantes coisas ali para falar. Nilda: Essa eu acho que é uma das histórias gregas que mais dá destaque à Creta, essa história do Minotauro, que dá o destaque e aí dá a visão ateniense sobre Creta, que era um reino muito importante antes de Atenas. Pablo: Quando você pega também a história de Dédalo e de Ícaro, invariavelmente… Ícaro, você consegue contar a história dele sem focar em Creta e sem focar em Minos, Cnossos, apesar de eu achar estranho. Ou seja, você pode tirar Ícaro de Creta e ainda contar a mesma história. É só dizer que ele estava em uma ilha, em um labirinto e saiu voando, mas se você entende que essa ilha era Creta, que o labirinto era embaixo do palácio de Cnossos, que foi feito pelo pai dele, Dédalo, a mando do rei Minos para esconder o Minotauro, as coisas começam a fazer um pouco mais de sentido. E aí você vê que todas essas histórias de alguma forma estão relacionadas, de algum jeito. Leonardo: Sim. A gente vai ver durante o episódio, ouvinte, que essas são duas narrativas que se cruzam várias vezes por causa desses personagens. Especificamente por causa do Minos e do Dédalo – isso que faz essas narrativas se cruzarem. Mas é interessante isso aí, porque do Teseu, ele é o protagonista desse mito, é o herói, e todo herói tem os seus desafios, tem os oponentes ali, os humanos, os reis, os déspotas que eles vão enfrentar, os monstros. No caso do Teseu, é o Minos sendo o vilão, digamos assim, vamos pôr dessa forma, e o Minotauro como o monstro oponente. E aí também tem um elemento também muito comum em algumas narrativas: a Ariadne – a gente vai falar mais dela no futuro. É comum que, nessas narrativas, os monstros principalmente, mas os vilões em geral sejam só o antagonista, só o obstáculo ali. Acaba não tendo muitos detalhes, mas nesse caso aqui a gente vê que tem. Isso, se você lembrar do episódio anterior, a gente vê que é por causa de toda essa história que Creta tem – história mesmo, não só narrativas e tudo, toda a história que Creta tem com a questão de ter um labirinto, de ter a adoração ao touro, de ter tido um ou vários, ou seja lá o que for, uma dinastia, o que for, referente a Minos. Tem um antecedente para dar conteúdo para esses personagens que aqui no mito do Teseu vão ser usados como adversários. E aí a gente vê a complexidade que tem toda a questão de Creta em si. Por isso que dá para falar bastante aí desses personagens, indo além do Teseu. O legal que, para falar disso, a gente não precisa nem começar a falar direto do Minotauro nessa época em si, a gente volta mais para o passado, antes, e a gente começa com Zeus e Europa. Europa, sendo uma princesa fenícia, ainda não era aí de Creta, estava lá de boa no reino do pai dela, e aí Zeus a viu e ficou encantado com a beleza dela, como é comum. Você sempre põe Zeus e alguma princesa, alguma mulher ali, você já espera… não precisa nem ser mulher, muitas vezes ali você já sabe o que vai esperar. E aí, no caso, ele se transformou em um touro – olha aí a imagem do touro – branco e se aproximou da princesa. Ela viu o touro, gostou do touro, foi e subiu nas costas ali do touro, montou nele. Logo que ela fez isso, o touro se levantou e partiu correndo com ela nas costas, então foi levando-a. Partiu mesmo, porque cruzou o mar e chegou a Creta. Ou seja, praticamente a raptou ali, mas, enfim, quando chegaram a Creta, finalmente eles transaram. Com isso, nascem três filhos, que são Minos, que é o que a gente mais vai falar aí, Sarpédon e Radamanto. E Zeus acabou dando como presente para a princesa um cachorro, que tinha a habilidade de não deixar nenhuma presa escapar, um dardo que nunca errava o alvo e Talos, que é um gigante de bronze que acabou se tornando o guardião da ilha. Muitas vezes você vê, ouvinte, descrito como esse Talos sendo um robô. Mostra que ele não seria um ser vivo, é bem uma criação mesmo. Nilda: No episódio anterior tem a história de um pesquisador chamava Creta de primeiro reino europeu, provavelmente por causa dessa questão mitológica: o Zeus, o deus grego, que levou a Europa para essa ilha. Quer dizer, o cara pegou, juntou tudo em um pacote só e misturou, e transformou em realidade. Como a gente viu no episódio, Creta não tinha muito a ver com o que a gente chama de Europa hoje, nem no século 19. Juliano Yamada: Só aproveitando e fazendo um adendo: foi um robô, mas pode ser até uma falha de tradução em relação ao autômato. Autômato é uma palavra grega bem antiga. Leonardo: Sim, sim. É, eu digo, você vê muitas vezes o pessoal descrevendo, “Isso é um robô”, às vezes até coloca entre aspas. Mas passa bem a ideia de ser um autômato. Pablo: Os gregos já tinham noção de máquinas avançadas que podiam ter movimentos semelhantes ao de um relógio ou de alguma coisa assim, que aí você vai ter: a mesma palavra autômato sendo usada para os gregos, vai ser usada depois, no século 16, inclusive por René Descartes, para poder descrever o funcionamento dos relógios e de máquinas que se assemelham ao funcionamento mecânico do próprio corpo. Juliano Yamada: Lembra daquela lenda do Hefesto fazendo um ajudante de bronze que se movimenta sozinho. Pablo: Sim, esse é um exemplo de autômato. Inclusive, tem uma relíquia bem antiga, se eu não me engano é minoica, que mostra engrenagens, e o pessoal: “Meu deus, mas como assim? Será que veio do futuro? Viajante do tempo?”. Não, eles já tinham esse conhecimento, eles sabiam como funcionavam engrenagens, eles sabiam como funcionava tudo isso, máquinas que podiam dar essa impressão, mas talvez eles só não tivessem condições de construir, materiais que fossem resistentes o suficiente para poder dar conta de alimentar tudo isso, mas eles já tinham esse conhecimento. Essa história do Hefesto é um resquício desses autômatos, mas o robô já é outra coisa diferente. Robô já vem do século 20. Nilda: Tem uma discussão que os historiadores vivem falando: o conhecimento não permanece; muito do conhecimento se perde com o tempo. Então você tem cretenses aprendendo, mexendo em engrenagens. Aí você chega na Idade Média, você tem o pessoal que não sabe mexer, mas é porque muito desse conhecimento vai se perdendo por guerras, por qualquer coisa. Aí você tem que reconstruir. Por isso que o povo fica achando que foi ET que trouxe, mas não, na verdade é só conhecimento que se perdeu. Juliano Yamada: É, a gente chegou a um período da história que teve muitos povos que esqueceram a utilidade da roda. Leonardo: E interessante falar aí do Talos. Agora a gente vai falar um pouquinho dele, esse personagem. Ele é legal que fala assim: “Ah, é um gigante bronze”. Então aí você vê também essa importância que nessa época aí se dava para o bronze, porque às vezes você vai pensar assim, se é para ser um construto, algo de metal ali, por que especificamente de bronze? Mas isso tem muita relação com o local e a época, então isso é interessante. E a gente, quando põe essa questão de construção, de criação, quando a gente vai colocar em alguma divindade grega, a gente pensa muito no Hefesto, e no Talos também tem a ver das duas formas que tem na versão da narrativa dele, porque o Talos tem uma versão que coloca que ele é neto de Zeus – mas aí ele é filho de um cara chamado Cres, que é o primeiro rei cretense, e aí que está a relação do nome de Creta, esse Cres, e no caso ele seria pai de Hefesto. Eu não vou lembrar agora qual é o autor dessa versão, mas é uma coisa bem específica, que normalmente você não vê o Hefesto tendo outros pais se não forem os deuses mesmos ali. Então essa versão até nem é tão conhecida. A que é mais conhecida, na verdade, é que ele é esse gigante de bronze e aí ele é uma criação do Hefesto, e aí que foi que Zeus deu de presente para a Europa e protegia a ilha, ficava jogando rochas. Ali, como era gigante, também as rochas eram grandes, e jogava em quem tentava se aproximar ou então ele tacava fogo. Uma coisa interessante desse personagem é que, como a gente tem em outros exemplos, outros heróis, na verdade – não que esse seja um herói, mas em alguns heróis – é o fato de ele ser praticamente invulnerável, mas com um único ponto fraco, que seria mortal, que aí no caso ele tinha uma veia na perna. Então ele seria todo ali de bronze, mas, na perna dele, ele teria uma veia, e ali era o ponto fraco dele, tanto que ele morreu por isso, quando Medeia, mais para frente lá, chegou ali no local e perfurou essa veia dele. Aí que ele morre. Juliano Yamada: É que eu não me lembro se existe ou não… acho que existe a associação, que geólogo é tudo nerd. Tem uma formação geológica chamada depósito de Talos, que são fragmentos grosseiros, daqueles bem quebradiços, que têm no sopé de montanha. Se descuidar, deve ter a ver com o nome Talos, porque geólogo não usa isso por nada. Leonardo: Interessante. Juliano Yamada: Porque não precisa ir muito longe: cretáceo surgiu por causa de uma descrição que foi feita de depósitos sedimentares de calcário branco que existia na Ilha de Creta. Então não está muito longe, não. Leonardo: Agora vou ficar procurando locais com nomes semelhantes aos outros períodos. Nilda: Considerando-se que boa parte desses nomes mais antigos que se usam hoje, mas que foram dados no século 19 e que também estava na moda estudar mitologia grega, romana e usaram esses nomes, porque aí seriam mais legais, mais pomposos, mais clássicos, não duvido. Não duvido que Talos tenha alguma coisa a ver com isso, viu? Troia também tinha uma história de que tinha um gigante perto que ficava jogando pedras também, e depois ele foi derrotado. Tem uma coisa assim também. Então não é muito incomum essas cidades terem esses gigantes que jogam pedra e que justifica elas demorarem para serem conquistadas também. Pablo: Pior que, se a gente pensar – pegar o que o Yamada falou dos vulcões – e imaginar que os antigos viam essas montanhas e pedras saíam voando dessas montanhas, a única coisa que você poderia pensar era que alguém estava jogando lá de dentro, e essa região está recheada de vulcões também. Então eu imagino que não deva ser incomum, justamente o que a Nilda falou, você ter essas referências a pedras sendo atiradas por gigantes de alguma forma. Juliano Yamada: Você vê que os gregos estavam a um passo de criar mitologias parecidas com os japoneses modernos: eles criaram autômatos gigantes, gigantes de bronze e monstros gigantes. Leonardo: Olha só. Juliano Yamada: Só que nunca teve uma lenda com embate de um gigante mecânico com um monstro gigante.
Juliano Yamada: Aí sim. Leonardo: Olha só. Juliano Yamada: Uma antecipação do Japão. [Trilha sonora] [Bloco de recados]
Leonardo: E aí voltando a falar, então, da linhagem de Minos, a gente tem ele e os seus dois irmãos. Eles foram, então, criados pela Europa e pelo marido dela, que aí Zeus foi lá, os teve e caiu fora, voltou lá para o Olimpo. Como pai é quem cria, então o pai deles, na verdade, foi o marido da Europa, que os criou, que aí no caso é o rei Astério. Ele era o rei da época, rei de Creta. Pablo: Não sei por que cargas d’água, o Dante Alighieri, quando escreveu A Divina Comédia, falou que tinha três juízes do inferno, e esses três juízes eram Minos, Sarpédon e Radamanto. Leonardo: Não é o Sarpédon, mas é o Radamanto. São os dois irmãos e o… Pablo: É, é isso, Minos, Radamanto e mais um. Leonardo: O Éaco. Pablo: É, eu não sei por que cargas d’água ele escolheu esses três, não sei que referência tem a juízes de mortos, porque essa é uma coisa que foi coloca por Dante, porque na história deles não diz que eles foram para o inferno serem juízes ao lado de Hades. Mas está lá no Dante Alighieri, e aí eles viraram cavaleiros de Hades. Eu não encontrei nenhuma referência antes de Dante que mostre Minos, Radamanto e Éaco como juízes de qualquer coisa. [Recado] Leonardo: Só fazendo uma nota aqui: no momento da gravação, ficamos em dúvida de onde seria a origem desses três juízes do submundo. Pesquisando mais a fundo, vimos que o filósofo Platão já os cita como juízes do submundo, e, nesse caso, o Éaco julgava os europeus; Radamanto, os asiáticos e africanos; e Minos seria o juiz com a decisão final. Inclusive, esse será um tema que a gente pode se aprofundar futuramente. Mas agora aí a gente continua com o episódio. Nilda: A Radamanto é atribuído o papel de ter escrito as leis de Creta. Talvez por isso. Já é jurista lá de Creta, vai ser jurista aqui no inferno também e pronto, acabou. Leonardo: E aí o Astério, que era o rei de Creta e que cuidou dos três filhos, quando morreu, os três começaram a brigar pelo trono, cada um falando que tinha o direito ali de ser o próximo rei. O Minos defendia que ele tinha o direito divino ao trono e que ele iria provar isso fazendo com que tudo que ele dissesse, tudo que ele quisesse, os deuses iriam atendê-lo. Ele pediu um touro para o Poseidon, e que aí esse próprio touro ele iria sacrificar para o próprio deus. O Poseidon ia enviar um touro e ele o sacrificaria para o próprio deus. A foram de ele provar também para os irmãos dele que ele tinha o direito, já que ele pediu isso para Poseidon e, se o deus cumprisse, então queria dizer que os deuses estariam do lado dele. E, de fato, foi o que ocorreu. Poseidon cumpriu a parte dele desse trato. O Minos pediu um touro e surgiu do mar um touro. Então aí os irmãos dele viram que “Ah, beleza, então o cara tem a palavra ali com os deuses. O que ele quer, ele consegue, então, beleza, ele conseguiu o reinado”. Só que Poseidon cumpriu a parte dele; o rei, já não. Ele resolveu guardar o touro para si mesmo. Em algumas versões, mostra que ele colocou até um outro touro para ser sacrificado no lugar desse aí e ele ficava lá passeando, ostentando o touro que ele tinha. O Poseidon ficou puto com isso. Já é um deus já estressado; aí ficou mais estressado ainda. Para se vingar, teve uma primeira vingança, que às vezes nem é relatada tanto, apesar de o resultado ficar mais conhecido, mas primeiramente o Poseidon fez o touro ficar louco. Essa foi a primeira vingança que o Poseidon fez com o Minos – daí que vem o touro de Creta. O Touro de Creta – esse nome Touro de Creta – é conhecido por ser um dos 12 trabalhos do Hércules, em que ele ia lá capturar o animal e ia levar para o rei Euristeu, – é outro rei dando problema – e o Hércules consegue fazer isso. Minos não quis ajudar, falou: “Eu não vou me envolver nisso aí, não tenho nada com isso”, mas ele foi lá, conseguiu pegar o touro e levou. O Hércules levou só para mostrar ali para o rei Euristeu, não chegou a matar. Mais para frente, o touro acabou sendo solto ali na cidade de Maratona, e aí causando problema onde ele estava, porque estava maluco, o touro, o touro ficou louco. Nilda: É só o povo correr. Leonardo: É. Aí que, na verdade, é a corrida de maratona. O pessoal tem aquela outra história, mas de repente a verdadeira é essa: eles estavam fugindo do Touro de Creta. Aí nesse momento em que ele estava lá enfurecido em Maratona, o Teseu conseguiu capturá-lo e o sacrificou, só que aí o sacrificou para Apolo. Ou seja, Poseidon ficou sem nada. Foi lá, entregou o touro, faz o touro e tudo pra receber o sacrifício e quem recebeu, no final das contas, foi o Apolo. Só que essa questão do Touro de Creta – a gente falou nessa ordem assim, parece que uma coisa logo depois da outra, mas não, isso é até meio que já fora do mito do Minotauro, do Minos. Mesmo que tenha sido o Teseu que matou o touro, já é uma coisa meio fora, não se envolve tanto na parte mais conhecida do mito de Teseu e o Minotauro. Mas é para mostrar que a primeira vingança do Poseidon foi essa de enlouquecer o touro, porque antes, na verdade, de o Hércules ir capturar o touro, o touro também ainda é importante para essa história. Ele é bem importante. Pasifae, que é a esposa de Minos, estava também puta da vida com ele, com o rei, por causa das traições. Ele a traía direto – puxou ao pai biológico -, estava sempre, constantemente a traindo. Uma das versões dessa traição até conta que ele raptou Ganímedes, bem estilo no mito de Zeus, porque aí às vezes coloca Zeus tendo raptado Ganímedes, mas aí tem uma versão que põe que Minos que o raptou e o colocou como amante. Isso aí agora não vou lembrar de cabeça quem é o autor grego, o autor antigo que conta isso aí, mas ele põe isso para mostrar a questão da pederastia. Nilda: A gente tem que lembrar que, por mais que a história do Minotauro seja uma história grega, você ainda tem toda aquela importância que Creta tinha, toda a importância da cultura cretense, e você tinha que dar um jeito de diminuir esses reis e tudo mais. E as rainhas eram extremamente importantes em Creta – você tinha isso também. Então eu acho que, independentemente dessa questão sexual ou não, provavelmente essas traições tinham a ver até com questão de diminuí-la politicamente. Leonardo: E aí, no caso, a rainha, a Pasifae, era a irmã de Circe, mulher que mexe com a magia mais famosa da mitologia grega. Ela era irmã dela e também mexia com magia, e aí ela lançou uma maldição ao marido dela em que toda outra mulher com quem ele dormisse iria morrer devorada por serpentes que iriam sair dos poros do próprio rei. Então é uma coisa bem bizarra. Ela dorme ali com o rei e acorda no outro dia e estão saindo serpentes ali da cara dele. Bem bizarro. Isso foi da Pasifae, fazer isso aí. Nilda: Olha, vou dizer que é uma mulher que sabe soltar maldição. Leonardo: Mas aí o rei consegue se livrar dessa maldição, volta ao normal teoricamente, mas os problemas não acabaram. O Poseidon – como eu falei, aquela foi a primeira vingança do Poseidon, que ele tinha feito o touro ficar maluco – não estava satisfeito com essa punição e aí então ele resolveu enlouquecer a Pasifae. Às vezes põe que ele pediu uma ajuda para Afrodite nesse caso, e tem lógica o porquê disso, de ele pedir ajuda para Afrodite, já que a loucura que ele fez não é dos domínios dele, é dos domínios da Afrodite, porque aí, no caso, ele fez a rainha ficar enlouquecidamente atraída pelo touro. Então estavam os dois loucos: o touro ficou louco e ela ficou louca pelo touro. Eu ia falar que isso é algo estranho, e realmente é estranho, mas a gente está falando de mitologia, então relações assim são estranhas, mas não são incomuns. Juliano Yamada:Você vê o relacionamento que Zeus teve; o da Pasifae seria normal em comparação ao que Zeus já fez. Leonardo: Mas, ainda assim, por mais que isso não seja algo tão incomum, essas relações desse tipo, ela precisou de uma certa ajuda para conseguir o que ela queria tanto, e aí ela pede ajuda para Dédalo. Mais para frente, ouvinte, a gente vai falar aí mais de Dédalo, mas, nesse momento, ele já estava aí em Creta – ele não é de Creta; se não me engano, ele é ateniense. Ele tinha já chegado aí em Creta, e ele trabalhava para o rei. E aí ela pede ali uma ajuda para ele, ele vai lá e cria um touro artificial, no qual ela iria ficar dentro… Pablo: Na verdade, no caso, é uma vaca, não é? Leonardo: Sim, é verdade. É, bom, enfim, seria uma vaca artificial, na qual ela ficou dentro desse construto, e aí eles iriam conseguir transar: ela, a rainha, e o touro. E esse é um momento bem importante dessa narrativa, que é daí que nasce o Minotauro. Pablo: O que é interessante, porque em muitas histórias, inclusive, que não levam em consideração a narrativa, só querem contar como surgiu o Minotauro, diz que Zeus foi em forma de touro para poder copular com a esposa do Minos, mas às vezes nem dá nome para ela. Porque Zeus se mistura, se fantasia de tudo para poder transar com as suas amantes, se fantasia até de chuva para poder chover sobre a mãe do Perseu, então por que não se fantasiar de touro também para poder entrar lá no meio e fazer tudo isso? Então tem algumas versões que colocam o Minotauro como filho de Zeus, fruto dessa união. Porém, não faz sentido, levando em consideração que Perseu não é meio chuva, meio humano, e considerando que as outras transfigurações de Zeus não fazem com que os seus filhos sejam necessariamente transfigurados. Leonardo: Essa versão, na verdade, você vê que eles encurtaram, eles cortaram uma parte ali, puxaram a ideia de Zeus se relacionar como touro com a Europa, e, na verdade, juntaram aí. Tanto é que você vê que Minos não é meio touro, ele é uma pessoa ali em formato humano, normal, e ele seria filho de um touro, aí no caso Zeus. É interessante parar para pensar nisso: quando você vê a narrativa completinha, como a gente estava mostrando aqui, você vê que mesmo Zeus se transformando, isso não faz a pessoa ser meio animal; agora, no caso da Pasifae, já é um animal mesmo. Não é uma divindade ali. Então já é uma relação diferente. Nilda: Para afirmar aquela coisa: você falar contra a zoofilia. Provavelmente tem esse caráter também didático. Pablo: Tome cuidado com os animais com que você transa para não formar seres híbridos. Juliano Yamada: Aproveitando, até estava dando uma revisada sobre a maldição da Pasifae, a característica não era que o Minos soltava serpentes pelos poros; era ejaculação mesmo. Leonardo: Então poro, na verdade, foi um nome só para não ficar… Pablo: Um eufemismo. Leonardo: É, só para poder sair no livro, para o livro não ficar com (inint) [00:29:46]. Juliano Yamada: Saía por ali mesmo, e não era só serpente: era escorpião, centopeia, pulga. Leonardo: Isso não pode ser uma alusão a DSTs? Juliano Yamada: Acho que provavelmente sim, porque ele só quebrou a maldição usando uma outra proteção, usando alguém que era mestrado na mesma magia da Pasifae. Eu só não achei quem é aqui. Leonardo: É, mas interessante ver dessa outra forma. Na verdade, é um poro só ali, não são vários. Nilda: E vou dizer que faz até muito mais sentido, porque esses povos não tinham medo de falar isso. Esses povos que eu estou falando são gregos e cretenses, nem nada. Você tem textos na Bíblia em que a maldição foi… não lembro qual povo tocou na arca da aliança. Eles começaram a ter doenças sexuais, aí fala no ânus. Para se redimirem, eles tiveram que entregar… toda pessoa teve que entregar uma peça de ouro em forma de ânus para doar para o templo. Era uma coisa assim, sabe? Está na Bíblia, (inint) [00:30:48] tipo “Não, tem que fazer mais ou menos na forma do ânus para entregar”, porque era para representar que deus tinha dado aquela doença para as pessoas. Eles não tinham medo de colocar doença venérea, inchar o saco, coceira no cu, qualquer coisa. Eles colocavam, porque isso existe, está na história. [Trilha sonora] Leonardo: Bom, e aí voltando ao Minotauro, o Minos ficou assustado e até envergonhado com essa criatura. Envergonhado, uma porque foi traído ali e pela própria aparência em si da criatura. E aí ele pede, então, para o Dédalo – nessa época ainda trabalhando ali para ele – para criar um labirinto para deixar o Minotauro ali preso. Aí tem também variações de quando que realmente foi criado esse labirinto. Foi criado para colocar o Minotauro ou já tinha esse labirinto, e aí colocaram o Minotauro ali? Mas sempre mostra a criação do Dédalo. Por ele ser um grande construtor, ele criou o labirinto. Pablo: Aí tem uma coisa interessante sobre a data, que a gente pode pensar o seguinte: Dédalo era o principal arquiteto de Creta, foi ele que projetou o palácio de Cnossos, foi ele que projetou a cidade, foi ele que projetou tudo e ajudou a construir tudo. Levando em consideração que Minos meio que foi o… ele não foi o primeiro, mas ele foi quem estava dando forma, tudo isso, não era de se espantar… e também que isso aconteceu com a esposa, aconteceu do tipo “Agora sou rei, vou fazer tudo isso”. Eu imagino que tudo isso deva ter acontecido na mesma época, sabe? Ele está lá construindo, tipo “Ah, vou pegar aqui o touro de Poseidon. Beleza, agora eu sou rei por direito divino, então agora eu vou fazer tudo. Então vem aqui, vamos construir a cidade, vamos construir o palácio”, “Ah, então sacrifica o touro”, “Ah, não vou sacrificar, ele é meu”. Então o touro ficou louco, e aí a esposa engravida, aí nasce um menino-boi. E aí o Dédalo está lá construindo. Eu imagino que o Minos chegou e “Porra, preciso me livrar desse piá, o que eu faço?”, “Ah, constrói alguma coisa”, “Ah, então constrói um labirinto para ninguém poder chegar a ele e ele não conseguir sair”. Então eu acho que tudo isso aconteceu mais ou menos na mesma época. Enquanto estava se construindo o palácio, Dédalo aproveitou. Estava fazendo tudo isso, e ele já aproveitou e fez. Leonardo: Sim, sim. Essa questão do labirinto, querendo ou não, mais uma vez relacionada à história real mesmo de Creta, dos minoicos. Tem a questão do labirinto, que se tinha ali. Tanto o labirinto mesmo do palácio em si quanto das cavernas, que eram algo bem religioso e que era de forma de um labirinto mesmo. Eles construíam – pegavam a caverna já natural ali, mas iam também moldando para ficar bem no estilo de um labirinto. Isso é da questão histórica mesmo de Creta. Então o labirinto que a gente vê na mitologia é referente a isso aí. Tanto que o labirinto, quando você se aprofunda mais na narrativa do Minos, a gente vê que não é só referente a prender ali o Minotauro. Ele também tem uma ideia de que o Minos se retirava de nove em noves anos para ir ao labirinto para prestar contas sobre os atos dele, o governo dele perante Zeus. Aí, se o deus estava descontente com o governo do rei, ele tinha que ficar ali por um tempo e, quando estivesse satisfeito, Zeus o permitia retornar para casa para voltar a reinar por mais nove anos. Você vê que ele ficava em um labirinto, então tem a ver com essa ideia de ter labirintos nos locais, de o Dédalo ter construído um labirinto e tudo mais, e, essa questão de nove em nove anos, a gente vai ver logo em seguida relacionada com a punição que Atenas sofria de Creta. Eles aproveitaram de várias formas esse conceito do labirinto que tinha realmente ali na ilha. Nilda: Bem interessante. É uma forma de, se você está descontente com o rei, você dar um jeito de esse rei não voltar dessa provação. A cada nove anos o rei se retira; ninguém está contente com esse rei, de repente, sei lá, ele não consegue voltar mais. Leonardo: Uma característica interessante, uma curiosidade interessante do Minotauro é esse nome: Minotauro. Seria o touro de Minos, está relacionado com o rei. Mas o nome dele, o nome verdadeiro mesmo, é Astério. Ouvinte, você lembra quando a gente falou aí do pai que criou Minos – era Astério. Era o mesmo nome do pai de criação do Minos, ele deu para o filho dele. Mas aí nasceu do jeito que nasceu, aí ficou esse apelido – aqueles apelidos que pegam e não saem mais. Bom, e aí seguindo a narrativa do Minos, a gente vê que o rei acabou entrando em conflito com a cidade de Atenas para vingar a morte de um dos filhos dele, que é o Androgeu. Lembra que também ele transava com um monte de mulher e tudo? E aí também ele tinha vários filhos. Aí um dos seus filhos, Androgeu, tinha vencido jogos em Atenas – então aí a gente já começa a ver o embate que começa a ter de Creta com Atenas -, e aí, com isso, por inveja do rei Egeu, que na época era o rei de Atenas, ele acabou sendo morto, o filho do Minos. E aí nisso que teve a guerra. A guerra durou muito tempo e não estava acabando, Atenas estava se ferrando com isso. A guerra não acabava e Atenas se ferrava, e, além disso, ainda acabou vindo uma peste, atingindo a cidade. Essa peste, na verdade, foi um pedido de Minos para Zeus. Então Minos tinha ali os deuses e tudo ao lado dele, porque ele passou a perna no Poseidon, mas inicialmente Poseidon confiou nele; pediu para Zeus – era o próprio pai dele – e Zeus ajudou. A peste estava destruindo tudo ali em Atenas junto com a guerra, e aí o rei Egeu, desesperado, vai até o oráculo de Delfos – sempre no oráculo de Delfos – tentando saber o que fazer, o que poderia fazer. Lá foi dito que a guerra e a peste só iriam acabar se ele aceitasse fazer qualquer exigência que o rei Minos tivesse. De certa forma, é meio lógico, porque de repente isso vai acabar com a guerra mesmo. Você faz ali a exigência que o seu oponente quer, acaba a guerra, nem que seja só dominar, mas pode acabar. E, querendo ou não, a peste dentro da mitologia é porque Minos pediu para Zeus, mas ter peste, principalmente nessa época, em local e época de guerra… extremamente comum. Por isso que é comum também você ver muitas narrativas: “Está tendo a guerra e também tem uma peste”, porque vai junto. Nilda: Está todo mundo se matando, todos os recursos de comida estão indo para a guerra. Por que será que o povo ficou doente? Pablo: É deus. Castigo divino. Leonardo: O rei Egeu, então, aceita a exigência do rei Minos, que ele seria obrigado a enviar sete homens e sete mulheres jovens de tempos em tempos à Ilha de Creta, que aí iriam servir de alimento para o Minotauro. Aí essa questão do tempo que eles fazem isso varia: às vezes fala que é anual, às vezes fala que é de sete em sete, às vezes fala que é de nove em nove. O que eu mais encontro é falar que é de nove em nove, porque aí é muito semelhante a esse que a gente tinha falado anteriormente, de o próprio rei se retirar de nove em nove anos. E aí então Atenas fica abaixo de Creta. Acaba tendo que pagar isso, então ferra a cidade. E aí, para acabar com isso, que aí que começa a parte mais famosa do mito, que é quando Teseu vai enfrentar o Minotauro. Vai acabar com essa dívida que Atenas tinha que pagar para Creta. O Teseu, no caso, era filho de Egeu. Algumas versões vão pôr que ele realmente era filho de Egeu; outras vão colocar que Poseidon se transformou em Egeu e aí então ele é filho de Poseidon; ou então que a esposa de Egeu dormiu com o marido dela, normal, e aí logo em seguida foi e dormiu com Poseidon. Então aí também seria filho de Poseidon. Fica essa questão. Mas indiferente no sentido: ele é um herói e tem muita relação com o Egeu mesmo, a questão de paternidade e tudo. A narrativa dele se prende muito à figura do rei mesmo, mesmo que de repente ele seja filho do Poseidon. E aí o Teseu se coloca como uma das pessoas a serem sacrificadas ao monstro, aí ele chega a Creta e, lá, a princesa Ariadne, que é a filha do rei Minos, se apaixona por ele. Lembra no início que eu falei: Ariadne é a donzela aí da história. Ela faz aquele papel da figura feminina que entrega itens e conselhos para o herói. Isso é comum a gente encontrar em algumas narrativas. Pablo: Ela acaba servindo de guia, inclusive, e ela, dentro da psicologia, é muito utilizada como uma figura que guia o herói através do inconsciente para poder fazer o que precisa fazer e poder retornar. Leonardo: Porque essa questão do guia é muito relacionada, porque ela entrega um novelo de lã para ele e fala: “Olha, prende esse novelo e vai soltando, para você saber o caminho que você fez, para você chegar até o Minotauro, derrotá-lo; mas só derrotar não seria suficiente, porque você pode ficar preso lá. Então, com esse novelo, você vai conseguir sair”. E o plano dá certo: Teseu encontra o Minotauro, o derrota e consegue sair ali do labirinto. O mais conhecido é isso, de ser um novelo de lã, que é até interessante, ele vai deixando e vai formando o caminho. As outras versões põem que acho que era uma tocha, era alguma coisa que iria iluminar também. Muda, às vezes, o objeto, mas o mais conhecido mesmo é o novelo. Ele consegue marcar ali o caminho. Pablo: Eu vi uma versão disso de iluminar que ele estaria usando uma vela para iluminar e a cera que ia caindo no chão ia servir para ele poder voltar. Nilda: Tem uma versão que é tipo um diadema que a Ariadne dá para ele, que é um diadema que brilha, mas eu não sei como isso iria ajudá-lo a se encontrar de volta. Leonardo: É, o do novelo é o que eu acho que acaba, pelo menos para nós, fazendo mais sentido, porque, se você está dentro de um labirinto, do jeito que normalmente é mostrado ali, estando de dia ou de noite, independentemente de onde você estiver, você vai estar preso do mesmo jeito ali. Não é tanto a questão da iluminação. Pablo: E o novelo é uma coisa que inclusive faz a gente pensar com relação a quão maravilhoso era Dédalo, ou não. Porque diz-se que o pedido de Minos era um labirinto tão difícil que ninguém fosse capaz de sair de dentro, que aí, uma vez que entra, não consegue mais sair. E Dédalo projetou isso a ponto de que o Minotauro pudesse entrar e ele não conseguisse mais sair. Só que aí o Minos chegou e falou: “Olha, então você, que construiu esse labirinto, já sabe qual é o segredo, então você vai ter que entrar, porque você não pode contar o segredo disso para ninguém, e você não mais vai conseguir sair. E ele de fato não conseguiu sair pela porta principal do labirinto, porque ele se perdeu lá dentro. Era um labirinto tão bem projetado que nem o próprio construtor conseguia sair dele. Ele conseguiu sair porque ele conseguiu construir uma forma de escapar e conseguiu sair voando por cima, por algum buraco de ventilação, sei lá. Ele conseguiu escapar voando da ilha, mas sair pela porta principal, ele não conseguiu. Mas lã consegue fazer com que você saia do labirinto. Ou seja, ninguém consegue sair, mas a sua vovozinha, que deixou cair um pedaço de lã na porta e foi desenrolando o novelo, consegue sair sem problema. Leonardo: Mas aí tem a questão de que esse novelo foi também uma indicação e uma criação também do próprio Dédalo. A Ariadne tinha pedido ajuda para o Dédalo, e o Dédalo que deu esse conselho, e aí ela passou para o Teseu. Então só ele também que conseguiu criar algo que conseguiria sair dali. Pablo: E aí é toda uma questão também de datas, porque, se já estava acontecendo esses sacrifícios e estavam indo para serem sacrificados, o Dédalo já tinha inclusive escapado da ilha, porque ele não ficou tanto tempo preso também. Aliás, ele ficou o suficiente com o Ícaro para ele poder juntar as coisas para ele sair voando de lá, mas não foi tempo suficiente. Mas, então, como a Ariadne perguntou para Dédalo? Foi antes? Foi depois? Foi do tipo “Me deixa uma dica antes de você entrar, se algum dia eu precisar”? Leonardo: É, por isso que principalmente eu acho que aquela questão de nove em nove anos que acaba não encaixando tanto nisso aí. Eu acho que o tempo seria mais curto, sabe? Porque também de nove em nove anos, aí já teria passado muito tempo. Sei lá, eu acho que era menos tempo. Isso a gente tentando criar uma lógica. Nilda: Mas eu vejo um outro significado nessa história do novelo de lá, porque o Pablo falou: “Ah, mas o novelo de lã da vovozinha é que resolve”. Mas aí talvez seja a questão de você criar todo esse labirinto, toda uma questão de força do rei, de um poder masculino, e o que acaba burlando isso é uma coisa feminina, à qual ninguém dá importância, que é o novelo de lã. Porque toda mulher, naquela época, costuma fiar, criar lã, então era um trabalho extremamente feminino você fiar, transformar a lã em linha mesmo para, depois, transformar em tecido. Então é uma coisa de mulher, a maior parte das mulheres sempre fiava e estava ali naquele trabalho. E aí o que consegue contornar tudo isso é o feminino, não é o masculino, não é a força, não é nada disso. É a ajuda feminina. Eu vejo muito por esse lado. Porque você pensou em várias alternativas; você não pensou em uma alternativa simples, da mulher, da lã da pessoa, porque você não liga para isso, você não repara. Leonardo: E aí esse novelo de lã o ajudou a sair do labirinto, mas aí eles também aproveitam e escapam da ilha. Também não adiantava nada eles ficarem lá, então eles conseguem escapar juntos. Em seguida, eles vão para a ilha de Naxos. Aí já começam a ter várias versões, e uma põe que eles ficaram lá por um tempo, ali, em uma noite; no dia seguinte, Teseu pega e vai embora e a deixa lá. Isso é uma versão. Tem outra que põe que o deus Dionísio se apaixonou por ela, a raptou e levou-a para o Olimpo, transformando-a em uma deusa. Mas essa ideia de ser o Dionísio em si pode estar relacionada com o fato de, originalmente, a própria Ariadne ter sido considerada uma deusa minoica da vegetação. No mito a gente a vê só como uma princesa, mas para os minoicos ela teria sido uma deusa mesmo da vegetação. Pablo: E aí é interessante a gente ver como as histórias são contadas por quais povos. Ariadne sendo uma deusa minoica, quando vai ser contada pelos gregos, perde o status de divindade – pelo menos provisoriamente – ou precisa ser justificado como ela vai ser, então, considerada uma deusa, mesmo levando em consideração que ela é neta de Zeus. Ela já tem ascendência divina, então ela poderia ser considerada pelo menos uma semideusa. Nilda: Ela não só é neta de Zeus, como tem uma versão em que Pasifae, a mulher do Minos, é filha de Hélio, deus do sol, uma coisa assim. Também teria origem divina. Pablo: Então seria prima também, uma prima-neta. É, genealogias gregas. Então, quando você tem uma civilização que conta a história de outra civilização – e aí é interessante, porque muito quando a gente lê da história e mitos cretenses, a gente tende a misturar tudo como sendo mitologia grega: “Ah, é tudo grego ali, eram as ilhas gregas, era tudo grego”. A gente não reconhece que na Ilha de Creta tinha uma civilização própria, que chegou durante um tempo histórico – historicamente falando, isso é mais importante do que todas as outras civilizações gregas que eram menores, eram mais pastorais, não eram tão desenvolvidas quanto era a da Ilha de Creta – e depois acabou, como várias civilizações, caindo. Mas você teve uma certa importância. E aí, como a história é contada depois pelos gregos, eles vão dar uma certa importância, relevância – afinal de contas, tem o palácio, tem um castelo, tem criaturas e tal -, mas você tem que tirar a divindade de ela tem, então você transforma a Ariadne em uma princesa mortal e ainda dá uma referência indireta à divindade, nesse sentido, que foi Dionísio, que concedeu a divindade depois. Leonardo: Sim. E o interessante do porquê ser o Dionísio é que, como eu falei, é uma deusa da vegetação e, nessa ilha em específico – então não é nem já em Creta, mas na Ilha de Naxos em si… porque essa é daquelas ilhas que ficavam mais ali logo em cima de Creta que, por um tempo, os próprios minoicos estiveram por ali, então ela tinha um culto ali, mas foi superado pelo do Dionísio. E aí a gente tem que lembrar que o Dionísio também é uma divindade relacionada à vegetação. O pessoal o coloca muito só na questão do vinho – popularmente, é visto como o Dionísio do vinho e coisa assim -, mas, com isso, relacionado à vegetação. Então ele tem, principalmente algumas versões que o ligam mais próximo ao orfismo. Ele está muito relacionado à vegetação. E aí o culto dele superou o dela, por isso que põe também essa relação. Nilda: Vou dar só um relato pessoal: a primeira vez que eu entrei em contato com a história de Teseu e o Minotauro foi na televisão, na década de 70, com o Sítio do Pica-Pau Amarelo, que teve todo um arco das crianças do sítio indo conhecer o Minotauro e tal. Tem toda uma história assim. E, de repente, chegava à última semana, matava o Minotauro, Teseu entrava no navio e tudo. De repente, aparecia um deus do nada que ficava com a Ariadne, ela ficava chorando porque o Teseu a abandonou, e aparece o Dionísio. Você fala: “Mas o que esse deus tem a ver com isso?”. Eu acho que foi o primeiro deus ex machina que eu me dei conta na vida, porque, de repente, no último capítulo: “Não, a Ariadne não vai ficar triste, ela está lá com um deus” e você: “Uai, o que aconteceu? De onde surgiu esse deus?”. Porque ele não aparece em nenhum momento. Na adaptação da década de 70, na TV, do Sítio, ele aparece só nesse momento final. Aí depois eu falei: “Gente, isso é deus ex machina”. O deus aparece no final: “Vou levá-la embora” e tudo bem. Pablo: Essa é uma coisa que me espanta, porque no livro do Monteiro Lobato, que ele tem um livro, uma história chamada O Minotauro, não é esse o final da história… de longe. Teseu nem aparece na história do Minotauro. O do Minotauro foi um dos primeiros que eu li, inclusive, porque eu gostava, na época, de mitologia grega e meu pai tinha a coleção dos livros do Monteiro Lobato. E aí, conversando com ele, ele falou: “Monteiro Lobato tem umas coisas de mitologia”, “Ah, é? Deixa eu ver. (Inint) [00:49:58] Minotauro, deixa eu ler”. Se eu não me engano, foi a primeira história do Monteiro Lobato que eu li, o Minotauro. Mas a história se passa logo depois das Reinações de Narizinho, que eu tive que ler para poder entender. Nas Reinações de Narizinho, Narizinho se casa com o rei e, depois da festa de casamento, o Minotauro aparece para sequestrar a Tia Nastácia. Então eles têm que usar de um pó mágico, que não é o de pirlimpimpim, é o que eles chamam de pó número dois – que o pó de pirlimpimpim te leva para qualquer lugar e o pó número dois te leva para qualquer tempo, então o pó número dois leva para fazer viagem no tempo, aí pirlimpimpim para viagem no espaço. Então eles viajam até a Grécia Antiga para poder resgatar a Tia Nastácia, e aí eles encontram o Minotauro, tem todas as aventuras e tal, e o mais engraçado da história é que, quando eles encontram o labirinto, seguem todas as pistas, encontram a Tia Nastácia, ela está fazendo bolinho de chuva para o Minotauro e o Minotauro está gordo de tanto comer bolinho de chuva e não consegue fazer nada. E aí tipo “A gente precisa lutar contra o Minotauro?”, “Não, está aqui, ele está gordo de tanto comer bolinho de chuva, a Tia Nastácia está o alimentando”, “Então vamos pegar a Tia Nastácia e vamos voltar para casa”. E assim eles voltam para casa. No meio do caminho – é uma história bem grande -, eles acabam encontrando alguns outros heróis e algumas coisas. Eles inclusive ajudam Hércules no segundo trabalho dele, que era contra a Hidra de Lerna, antes de chegar ao Minotauro. E aí, depois que eles voltam para casa, eles resolvem visitar de novo Hércules para ver todos os trabalhos de Hércules. Aí é uma outra história do Monteiro Lobato, que é Os Doze Trabalhos de Hércules, e que, enfim, são algumas referências. Mas eu achei essa saída dos bolinhos de chuva genial. O Minotauro lá gordo de comer bolinho de chuva, não consegue fazer nada, não consegue correr atrás. Nem precisa lutar contra ninguém. [Trilha sonora] Leonardo: Bom, no geral, esse aí é o mito do Minotauro em si, porque o Minotauro morreu aí, foi derrotado pelo Teseu; o Teseu voltou. O Teseu continua, algumas coisas lá, tem problema com a questão do pai dele, que acaba se matando e tudo mais, mas a questão do obstáculo do Minotauro, referente ao mito do Minotauro, termina aí com a morte dele. Mas o Minos e alguns outros personagens aí ainda continuam algumas coisas, como por exemplo do Dédalo e o Ícaro, que a gente já citou algumas partes. Lembre-se, ouvinte, que a gente falou que se cruza várias vezes com a questão do mito do Minos. O Dédalo já é um personagem até mais conhecido, mas, só para deixar mais detalhes, ele era de Atenas e estava exilado em Creta. Como a gente falou, ele era arquiteto, inventor, escultor, trabalhava várias coisas assim, manuais. E ele era mestre do sobrinho dele, chamado Talos. Tem o mesmo nome do gigante, mas são coisas distintas mesmo, são personagens distintos. Só que aí ele começou a ter inveja do sobrinho dele, porque ele viu que as habilidades do sobrinho dele estavam melhorando ali e tudo, ele estava ficando bom mesmo e, então, com inveja, com medo de pegar o lugar dele, pegou e o matou, e isso foi o motivo do exílio dele. Aí ele foi para Creta, e aí que ele começa a trabalhar para o rei Minos, teve o Ícaro com uma escrava local e aí fez todos esses trabalhos: construiu o labirinto, construiu o touro artificial ali, o construto, para a rainha, ele que deu a dica para a Ariadne ajudar o Teseu. Tudo isso aí foi enfurecendo o rei. Ele ajudou a princesa, então isso deixou o rei puto, e é aí quando prende no labirinto. E quando prendeu, antes, e tudo – tem essas variações, como a gente falou -, mas ficou nisso, ele acabou sendo preso no labirinto junto com o filho dele. E aí como vai escapar é aquela coisa já bem conhecida de ele pegar penas e ceras para fazer asas para ele e para o sobrinho dele para escapar voando, porque aí eles iam escapar do labirinto e da ilha. Pablo: Essa é uma coisa que eu sempre fiquei me questionando, porque algumas versões da lenda dizem que o labirinto ficava embaixo do palácio, mas, para ele poder ter acesso a penas e a cera de abelha, tinha que ter pelo menos alguma parte do labirinto que ficasse aberta para que os pássaros pudessem voar por cima e ter abelhas ali para poder construir algum tipo de colmeia ali dentro. Então não era completamente subterrâneo. Ou então como que as abelhas entravam no labirinto e ficaram lá e os pássaros ficaram lá e conseguiram (sair) [00:55:08]? Juliano Yamada: Não, mas também tem um outro detalhe, que eles fazem asas para saírem voando do labirinto. Pablo: Sim, mas a forma como eles constroem as asas é pegando as penas dos pássaros, que caíam dentro do labirinto, e a cera de abelhas, que ele conseguia pegar das colmeias, que acontecia lá dentro. Juliano Yamada: Eu sempre fiquei com o pé atrás com essa lenda: de onde surgiu matéria-prima? Mas aí também a solução: eles precisam voar para ter a solução. Aí eu fiquei lembrando que existem em alguns… eu acho que lá na Grécia tem, porque eu sei que algumas ilhas próximas têm aqueles jardins que surgem dentro de crateras vulcânicas. Se você cair dentro de uma dessas crateras, você não sai mais. É impossível escalar, é impossível você conseguir fazer uma corda; sem ajuda externa, você não consegue. Mas são jardins: tem abelhas, tem pássaros, tem árvores, tem tudo, tem rio, você vê o céu, mas você não alcança se você estiver sozinho lá dentro. Tem até algumas coisas aqui. Acho que o Buraco do Padre é parecido, aqui no Paraná; tem as Furnas também. Por isso que eu ficava pensando… eu também tinha a mesma dúvida que o Pablo: de onde veio a cera? De onde vieram as penas? Aí me veio o pensamento: por que a solução voar? Por que eles precisam voar para ter essa solução? Aí eu fiquei pensando: se o labirinto é vulcânico, tem uma associação vulcânica, eles devem ter visto alguma coisa assim, então provavelmente é um jardim dentro de uma cratera, que você não consegue sair – de forma terrestre, você não consegue sair. Então eu sempre ficava fazendo isso, essa associação. Nilda: É, e a gente tem a ideia também que o labirinto era só um emaranhado, sei lá, de paredes, sem nada. Ninguém disse que é um emaranhado de paredes, sem nada, que não pudesse ter jardins ou coisas ali no meio. Leonardo: Tinha que ter algo para entreter o boi, o touro ali, então criava um pasto ali para ele. Tanto é que carne humana ele comia só de nove em nove anos; nos outros anos, ele ficava pastando. Juliano Yamada: Mas tem, procura assim: acho que são jardins dentro de crateras. Deve ser. Leonardo: Bom, e aí eles, então, conseguem escapar ali do labirinto e da ilha voando com essas penas e cera, e é aquela ideia: não voa muito baixo, para a umidade não soltar a cera e tudo mais, as penas, não molhar as penas nem nada, mas também não voe muito alto, que senão a cera acaba derretendo por causa do sol. Ícaro se empolga e acaba subindo, vai voando muito alto e acontece isso de derreter a cera. Ele cai no mar, se afoga. O Dédalo não, o Dédalo consegue escapar, foge para a ilha da Sicília. Só que aí o Minos ainda está perseguindo o Dédalos. Ele viu que fugiram e não deixou isso barato, ele foi atrás. Foi até a Sicília, e aí o rei local ali prometeu para o Minos: “Não, beleza, você está perseguindo-o, eu vou te entregá-lo, fica tranquilo”, só que, na verdade, ele também passa a perna no Minos. Com a própria ajuda do Dédalo, eles trocam a água do banho ali do rei Minos – que ele foi, o rei, então, “Beleza, vou tomar um banho aqui enquanto estou esperando aí você entregar quem eu estou procurando, o Dédalo”, só que aí eles fizeram essa troca e colocaram uma outra substância. Aí às vezes varia o que eles colocaram em si, mas normalmente mostra que é uma substância incandescente, e aí, com isso, eles acabam… o rei local ali – que não me lembro se cita o nome, acho que não fala o nome – e o Dédalo acabam matando o rei Minos, e aí que realmente acaba toda a narrativa do Minos, que, no máximo, vai continuar quando ele se tornar um juiz do inferno, agora aí como a gente tinha falado anteriormente. Então nesse ponto a gente já tem que o Minotauro morreu; o Minos morreu; mas aí a gente tem as descendências do rei Minos. Um dos filhos dele se chamava Deucalião. É o mesmo nome do sobrevivente do dilúvio, mas é outro personagem – mas é o mesmo nome -, e aí ele assume o trono. Ele teve um filho chamado Idomeneu – que o outro Deucalião também tem um filho com esse nome. Esse Idomeneu participou da Guerra de Troia. Em uma das versões da narrativa do retorno para casa, diz que eles passaram por uma tempestade forte, e aí, para pedir ajuda do Poseidon para chegar a salvo, ele prometeu que ia sacrificar o primeiro humano que ele encontrasse na Ilha de Creta. Beleza, conseguiu chegar a Creta. Quando ele pisa ali, a primeira pessoa que ele vê é um dos filhos dele. Ele fica assim, tipo, “O que eu vou ter que fazer?”. Mas, com dor no coração, ele faz o que prometeu. Os outros deuses ficam puto com essa crueldade que ele fez; ele acabou matando o próprio filho dele. E aí eles enviam uma peste para Creta. Essa é a lógica divina: uma pessoa morreu de forma cruel, eles mandam a peste ali para matar mais pessoas. E aí a peste só passou quando o rei se exilou. Outra curiosidade também que a gente vê nisso aí, que você viu que os deuses ficaram putos com ele porque ele cumpriu a promessa do sacrifício, que ele fez; e o Minos tinha também se ferrado porque ele não cumpriu a promessa que ele fez, do sacrifício. Ou seja, você é grego e está tentando se resolver aí com os deuses? Você está ferrado de qualquer jeito. Não importa se você vai cumprir ou não o que você está prometendo. Nilda: Fica longe. Tenta ficar longe. Leonardo: E aí acaba a narrativa em si do Minos em geral. A gente falou de alguns descendentes dele, mas o Teseu já foi para outro canto. Aí nessa parte já tinha até enfrentado o Touro de Creta, que é a coisa que ele faz lá em Maratona depois, mas o interessante é você ver que a gente praticamente nem falou do Teseu direito. A gente falou ali da parte que realmente ele está em Creta, sendo que nem precisou falar disso. Os próprios personagens ao redor e antagonistas em si já têm bastante coisa a se falar. Isso eu acho bem interessante, esse eu acho um diferencial dessa narrativa. O próprio Minos em si já é uma figura forte. Dificilmente foi só uma pessoa mesmo. Quase que não se tem muito essa ideia, de ter sido só um; é muito provável que, na verdade, todas essas características sejam baseadas em várias personagens ou então que seja uma dinastia. É muito isso aí. Mas se tem uma questão histórica do porquê; muito de Creta tem isso, porque eram os gregos se relacionando com esse outro povo, que eram os minoicos – falando mal desse outro povo, porque eles rebaixam, então põem o Minos bem como um vilão. Pablo: É muito comum nas histórias você representar – quando você mistura história e mito, e muitas vezes você cria mitos para poder justificar fatos históricos, você cria narrativas para poder justificar fatos históricos, como por exemplo a questão de Troia. A gente sabe hoje em dia que existiram várias guerras de Troia, existiram várias Troias construídas e reconstruídas naquele mesmo lugar onde seria Troia, mas a gente só conta de uma Guerra de Troia, que durou dez anos. E o que a gente tem é o principal relato, que é de um livro que conta os últimos momentos dessa guerra, que aí faz muitos flashbacks, mas é basicamente os últimos momentos, a queda de Troia só. Mas são várias Troias, várias guerras, vários conflitos que aconteceram naquela região. E a mesma coisa acontece com várias dessas histórias. No caso de Creta, por exemplo, se a gente for contar basicamente só o que diz o mito, a civilização devia ter durado o quê? 50 anos. Porque, pensa, a civilização mais ou menos começa ali quando Minos nasce. Você tem Cres ali, que era rei, mas tudo começa com o próprio Minos; depois Minos morre na Sicília. E aí depois você tem lá os filhos dele, mas não foi muito para frente. Então ali foi o quê? No máximo 50, 60 anos, se a gente for fazer tudo cronológico-histórico. Então não faz muito sentido. Isso faz sentido quando você quer mitologizar um fato histórico, e aí você cria um personagem para poder justificar ou personificar tudo que aconteceu, que nem, por exemplo, a história da fundação de Roma através de Rômulo e Remo. Roma nunca surgiu assim, isso foi criado, de fato. E, no caso de Roma, a gente sabe que foi encomendado, inclusive. O cara criou essa história para contar, ou pelo menos ele escreveu uma história popular que era contada, mas você não tem como dizer que esse é um fato histórico. Então é bem comum que os gregos, ao recontarem a história de Creta, tenham reunido todas as histórias e acontecimentos em torno de uma só pessoa, que era o Minos, da mesma forma como a gente conta na questão do faraó e de Moisés. Eu tenho certeza que tudo que é contado na história de Moisés é baseado em algum acontecimento histórico, que tanto os egípcios quanto os hebreus tinham acesso, mas não aconteceu tudo naquela semana de fuga do Egito. Esses eram relatos que estavam contando através de diferentes povos, de diferentes épocas, de diferentes acontecimentos históricos, que de repente foram colecionados todos para poder justificar uma determinada história, que é a história de Moisés. E, para mim, Minos tem muito essa cara, que é um personagem que foi mitologizado para poder justificar uma série de questões históricas. A mesma coisa do Minotauro: a civilização cretense é uma civilização que se constrói em torno da figura do touro. Você tem uma iconografia de touro muito forte na ilha; e do próprio labirinto como até uma figura estética. Então por que não dizer que o filho do rei Minos era meio touro? Aí você cria toda essa história também para poder diminuir o outro povo. Leonardo: O que eu acho interessante – você citou a questão da Guerra de Troia também – é que a gente vê que nessa narrativa o próprio neto do Minos que participou da Guerra de Troia e tudo. Então você vê que toda essa narrativa é feita até antes, é bem antiga e se passaria até antes da Guerra de Troia, que já é algo em um tempo mítico ali. Se você pensar que os minoicos e a relação deles com os gregos também foi algo extremamente antigo, anterior, foi um dos primeiros pontos ali históricos na região em si, então faz sentido a narrativa em geral ser bem antiga mesmo, antes até da Guerra de Troia e tudo mais. Apesar que tempo a gente sempre tem que ter essa questão de que, quando vai para o mitológico, a gente mexe na duração do tempo. Mas é legal ver essas relações e ver que, por mais que tenha diminuído a imagem de Creta em si, coloca-a como vilã, como um local do vilão ali, toda a imagem do touro, desses elementos, labirinto, se mantêm. É algo forte para os minoicos e, com isso, para os cretenses. Bom, ouvinte, então esse foi o episódio que a gente falou de Minos e do Minotauro. Nem focamos em si no Teseu, mas falamos principalmente desses dois personagens, porque eles, sim, são os cretenses; eles, sim, estão relacionados aos minoicos. Com isso, a gente conclui o que a gente começou no episódio anterior, no qual a gente falou do auge e queda dos minoicos, e nesse a gente fala já da versão grega, e aí a narrativa do Teseu e o Minotauro. Espero que tenham gostado e a gente se vê no próximo episódio. [Trilha sonora] [01:08:42] (FIM)